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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 72, p.140 - 167, jan. - mar. 2016

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namorados ou maridos/companheiros. O fato de um terço das mortes ter

ocorrido no domicílio da vítima reforça a ideia de que se trata de feminicí-

dio ou mortes provocadas por parceiros íntimos, familiar ou conhecido das

vítimas.

3

Sabe-se também que um grande número dessas agressões ocorre

justamente quando elas decidem pôr fim à relação ou quando manifestam

seus pontos de vista contrários aos de seus maridos ou companheiros.

4

Nas últimas décadas o índice de homicídios de mulheres aumentou

bastante no país, sendo um dos maiores das Américas. O número de mu-

lheres que foram mortas por seus companheiros/maridos gira em torno

de 10% do total de mortalidade por agressão, fato que pode conferir im-

portância secundária a esse evento, havendo poucos estudos nesta área.

No entanto, mesmo com frequência menor, este crime geralmente está

relacionado à condição de gênero.

Analisar esse fenômeno possui relevância observando o caráter so-

cial das diferenças de gênero existentes na sociedade brasileira. Concei-

tualizar como feminicídio os assassinatos de mulheres pelo fato de serem

mulheres constitui um avanço na compreensão política do fenômeno que

era há pouco tempo invisibilizado. Não é um fenômeno isolado das nossas

realidades, ao contrário, é uma das consequências mais cruéis da subordi-

nação da mulher e da negação da sua autonomia. Partindo dessa premis-

sa, a análise desses delitos não pode ser dissociada do fator discriminação

que sofrem as mulheres, da violência estrutural, sistemática e da ausência

de políticas públicas visando a prevenção, a punição e a erradicação desse

tipo de violência contra as mulheres. Estamos frente a uma sociedade que

tem o dever de respeitar, proteger e promover o direito a uma vida livre

de violência.

2. A CONTRIBUIÇÃO DO MOVIMENTO FEMINISTA

Na década de oitenta, os movimentos de mulheres e feministas da

América Latina e do Caribe começaram a desenvolver ações para visibili-

3 "Femicídios: homicídios femininos no Brasil". Disponível em:

www.scielo.br/rsp.

Acesso em 19 de outubro de 2011.

4 O “Mapa da Violência 2015”, trabalho desenvolvido pelo pesquisador Julio Jacobo Waiselfisz e elaborado pela

Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), revela ainda que 50,3% das mortes violentas de mulheres

são cometidas por familiares e 33,2% por parceiros ou ex-parceiros. Entre 1980 e 2013 foram vítimas de assassinato

106.093 mulheres, 4.762 só em 2013. A situação das mulheres negras, neste último estudo, merece atenção espe-

cial: “as taxas das mulheres e meninas negras vítimas de homicídios cresce de 22,9% em 2003 para 66,7% em 2013.

Houve, nessa década, um aumento de 190,9% na vitimização de negras, índice que resulta da relação entre as taxas

de mortalidade brancas e negras, expresso em percentual."