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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 72, p. 140 - 167, jan. - mar. 2016

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Feminicídio: Uma Análise Socio-

jurídica do Fenômeno no Brasil

Adriana Ramos de Mello

Juíza de Direito do Estado do Rio de Janeiro. Mestre

em Ciências Penais pela Universidade Candido Men-

des e Doutoranda em Direito Público pela Universi-

dade Autônoma de Barcelona.

1. INTRODUÇÃO

Um dos grandes desafios do século XXI é a erradicação da violên-

cia de gênero. A forma mais extrema dessa violência contra as mulheres,

denominada feminicídio, assassinato de mulheres em vários contextos, é

um fenômeno que foi invisibilizado durante milênios. O termo femicídio/

feminicídio foi usado pela primeira vez por Diana Russell e Jill Radford, em

seu livro

Femicide: The Politics of Woman Killing

, publicado em 1992 em

Nova York.

1

A expressão já tinha sido usada pelo Tribunal Internacional de

crimes contra as mulheres em 1976 e foi retomada nos anos de 1990, para

ressaltar a não acidentalidade da morte violenta de mulheres (ALMEIDA,

1998, p.1). A opção desse termo serve para demonstrar o caráter sexista

presente nestes crimes, desmistificando a aparente neutralidade subja-

cente ao termo assassinato, evidenciando tratar-se de fenômeno inerente

ao histórico processo de subordinação das mulheres (GOMES, 2010).

O assassinato de mulheres não é algo novo nem diferente, sempre

existiu e, talvez, seja essa a questão.

2

Em termos estatísticos, o assassinato

de mulheres talvez seja o crime menos revelado nas ocorrências policiais

e um dos crimes mais subnotificados. Não se registram adequadamente

as circunstâncias do crime quando este ocorre no âmbito das relações

afetivas entre companheiros/cônjuges.

Enquanto o homem sofre com a violência ocorrida no espaço pú-

blico que, via de regra, é praticada por outro homem, a mulher sofre mais

com a violência ocorrida no espaço privado e os agressores são (ou foram)

1 Disponível em

www.dianarussell.com/femicide.

Acesso em 20 de outubro de 2011.

2 Nas Ordenações Filipinas havia um artigo que permitia o assassinato da mulher pelo marido, se esta fosse consi-

derada adúltera.