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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 71, p. 159 - 186, nov. - dez. 2015

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dade de normas é que se poderá construir o efetivo significado da condu-

ta leal e proba adequada àquele caso específico

6

.

O segundo fator a ser considerado é a atuação da boa-fé objetiva

como um

standard

jurídico. Um

standard

é um modelo objetivo de con-

duta, pautado, no caso da boa-fé, por valores como honestidade, lealdade

e probidade

7

.

A referência a modelos de conduta remete automaticamente a conhe-

cidas construções doutrinárias, como o “homem médio” e o “

bonus pater

familias

”. Contudo, mesmo enraizado na cultura jurídica brasileira, o recur-

so a tais modelos abstratos de comportamento tem sofrido severas críticas,

afirmando-se que sua unicidade e elevada generalização revelam-se inúteis

frente à multiplicidade das situações de fato

8

. A boa-fé objetiva não se repor-

ta a modelos abstratos de conduta, mas sim a modelos objetivamente cons-

truídos com atenção às particulares circunstâncias do caso concreto

9

. É essa

variação de

standards

de comportamento nas diversas relações que autoriza

o reconhecimento de uma eficácia diferenciada à boa-fé.

Na precisa afirmação de Gustavo Tepedino e Anderson Schreiber:

“a boa-fé objetiva não pode ser aplicada da mesma forma às

relações de consumo e às relações mercantis ou societárias,

pela simples razão de que os

standards

de comportamento

são distintos.”

10

6 Miguel Reale assinalava que “a adoção da boa-fé como condição matriz do comportamento humano, põe a exigên-

cia de uma ‘hermenêutica jurídica estrutural’, a qual se distingue pelo exame da totalidade das normas pertinentes

a determinada matéria. Nada mais incompatível com a ideia de boa-fé do que a interpretação atômica das regras

jurídicas, ou seja, destacadas de seu contexto. Com o advento, em suma, do pressuposto geral da boa-fé na estrutu-

ra do ordenamento jurídico, adquire maior força e alcance do antigo ensinamento de Portalis de que as disposições

legais devem ser interpretadas umas pelas outras” (REALE, Miguel.

A Boa-Fé no Código Civil

. Disponível em: <http://

www.miguelreale.com.br>

. Acesso em: 06 jan. 2014).

7 MARTINS-COSTA, Judith.

A Boa-Fé no Direito Privado

: sistema e tópica no processo obrigacional. São Paulo: Re-

vista dos Tribunais, 2000, p. 411.

8 SCHREIBER, Anderson.

Novos Paradigmas da Responsabilidade Civil

: da erosão dos filtros de reparação à diluição

dos danos. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 39-41.

9 MARTINS-COSTA, Judith.

A Boa-Fé no Direito Privado

,

op. cit.

, p. 412-413.

10 TEPEDINO, Gustavo; SCHREIBER, Anderson. "A Boa-Fé Objetiva no Código de Defesa do Consumidor e no Novo Có-

digo Civil."

In:

TEPEDINO, Gustavo (coord.).

Obrigações: estudos na perspectiva civil-constitucional

. Rio de Janeiro: Re-

novar, 2005, p. 43. No mesmo sentido, a lição de Antônio Junqueira de Azevedo: “Naturalmente, há várias determina-

ções possíveis, segundo o tipo de área de atividade ou de negócios que as partes estão fazendo. Já nas Ordenações do

Reino se prescrevia que quem compra cavalo no mercado de Évora não tem direito aos vícios redibitórios. Os

standards

variam. Se um sujeito vai negociar no mercado de objetos usados, em feira de troca, a boa-fé exigida do vendedor não

pode ser igual à de uma loja muito fina, de muito nome, ou à de outro negócio, em que há um pressuposto de cuidado”

(JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antônio. "Insuficiências, deficiências e desatualização do Projeto de Código Civil na questão

da boa-fé objetiva nos contratos."

Revista Trimestral de Direito Civil

. Rio de Janeiro: Padma, v. 1, jan./mar., 2000, p. 4).