

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 71, p. 141 - 158, nov - dez. 2015
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dada na busca por essências, ou seja, orientada pela metafísica.
31
Melhor,
portanto, utilizar o termo
condição de possibilidade
.
Essa hipótese de defeito, entendida como decorrente da omissão
de condição de possibilidade do ato, aplica-se aos casos de não realização
da audiência de custódia no momento em que o auto de prisão em fla-
grante é analisado nos três níveis, descritos acima.
Supostamente, trata-se de defeito sanável do ato processual, cuja
convalidação ocorreria nas hipóteses previstas no art. 572, I a III, do Códi-
go de Processo Penal.
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Ocorre que, havendo prazo estabelecido para encaminhar o preso
para realização da audiência de custódia e não sendo essa realizada no
prazo de 24 horas, estabelecido no Código de Processo Penal, impossível
refazer o ato defeituoso.
Além disso, também é impossível ignorar que a não realização da
audiência de custódia inviabiliza que o imputado e o defensor manifes-
tem-se, ou seja, viola o princípio constitucional do contraditório. Ignorar
o direito constitucional ao contraditório é, em última análise, negar vali-
dade à Constituição.
O imputado não pode ser responsabilizado pela desídia do Esta-
do com o descumprimento de normas. O Estado cria normas (inclusive
as normas constitucionais), estabelecendo obrigações para si e para os
cidadãos. Não pode, depois de criar as obrigações para si, imputar aos
cidadãos a responsabilidade pelo próprio descumprimento.
Se o Estado não realiza a audiência de custódia no prazo de 24 ho-
ras e o julgador fixa medida(s) cautelar(es), o ato processual não pode ser
refeito, durante audiência de custódia designada posteriormente, porque
ultrapassa o prazo fixado no Código de Processo Penal. Sendo a realização
da audiência condição de possibilidade para a análise do auto de prisão em
flagrante e a fixação de medida(s) cautelar(es), a homologação do auto e a
fixação de medida(s) sem a apresentação do preso causa defeito insanável.
31 Lenio Streck explica que “[...] metafísica é a pretensão a uma verdade absoluta.”
In:
STRECK, Lenio Luiz.
Herme-
nêutica jurídica e(m) crise
: uma exploração hermenêutica da construção do Direito. 11. ed. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2014, p. 258.
32 Art. 572. As nulidades previstas no art. 564, Ill, d e e, segunda parte, g e h, e IV, considerar-se-ão sanadas:
I - se não forem argüidas, em tempo oportuno, de acordo com o disposto no artigo anterior;
II - se, praticado por outra forma, o ato tiver atingido o seu fim;
III - se a parte, ainda que tacitamente, tiver aceito os seus efeitos.
BRASIL.
Decreto-lei n.º 3.689, de 3 de outubro de 1941
. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689Compilado.htm>. Acesso em: 10 jul. 2015.