

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 68, p. 178-216, mar. - mai. 2015
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Observa-se que, em ordenamentos jurídicos estrangeiros de tradi-
ção republicana e democrática, a jurisdição exercida nas causas da Fazen-
da Pública é diferenciada. O contencioso desloca-se do Poder Judiciário
e é exercido no âmbito da própria Administração Pública, chamando de
“Contencioso Administrativo”, como ocorre do direito francês, italiano e
português. No direito português, a jurisdição administrativa decorre de
determinação constitucional, criando uma categoria diferenciada de tri-
bunais administrativos e fiscais.
Por conseguinte, justifica-se a manutenção das prerrogativas
processuais, dentre as quais o regime de execução diferenciado, equivo-
cadamente interpretadas como privilégios em favor da Fazenda Pública,
por ser sua função principal a promoção do interesse público, o qual deve
ser preservado, prevalecendo sobre os interesses particulares.
E não é por outra razão que o projeto de novo Código de Processo
Civil manteve tais prerrogativas, trazendo contudo, alterações as quais se-
rão objeto do presente estudo. Assim, pretende-se verificar, à luz de uma
leitura constitucional, se as alterações propostas pelo código projetado se
encontram em consonância com a preservação do interesse público ou se
haveria inconstitucionalidade em determinadas modificações que preten-
dem dispensar tratamento paritário entre a Fazenda Pública e o particular,
quando em verdade não o são.
1. CONTEXTO HISTÓRICO BRASILEIRO
Desde os tempos do Brasil Colônia, a Fazenda estava submetida ao
mesmo regime de execução que o particular, ou seja, a expropriação por
meio de penhora, independentemente da natureza do bem, para satisfa-
ção da obrigação.
O sistema embrionário da cláusula de inalienabilidade e, por con-
sequência, a de impenhorabilidade foi instituído por uma Lei de 1582,
que dispunha da impenhorabilidade de bens de propriedade de Fidalgos,
Cavalheiros e Desembargadores, ou seja, tratava-se de um privilégio dos
nobres, não havia relação com a afetação do bem à finalidade pública, ou
ainda a sua natureza de bem público.
A Constituição do Império, de 1824 previa ainda de forma tímida
certa prerrogativa da Fazenda, de forma que seus bens apenas poderiam
ser alienados com autorização do Legislativo, afastando parcialmente a
Fazenda da forma de execução destinada ao particular.