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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 516 - 525, jan - fev. 2015

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É assustador o pragmatismo de porta-vozes de corporações ao

tentar justificar a moldura de concentração monopólica da mídia. Tudo

parece natural quando se ambicionam rentabilidade e dividendos compe-

titivos. O vice-presidente do grupo espanhol Prisa e fundador do jornal

El

País

, José Luis Cebrián, não poderia ser mais preciso ao referir-se à men-

talidade empresarial que comanda o setor: “A concentração dos meios de

comunicação tem lugar no âmbito da concentração industrial e lutar con-

tra ela é como lutar contra a força da gravidade. (...) Sem empresas fortes

não há liberdade de expressão e, num mundo global, apenas as empresas

sólidas resistem.”

8

A experiência histórica indica exatamente o oposto do

enunciado de Cebrián: quanto maior a concentração de poder nas mãos

de um reduzido número de corporações, menor a chance de pluralidade

nos canais de manifestação de pensamento.

A questão crucial da diversidade

No processo de reprodução ampliada do capitalismo, o sistema mi-

diático desempenha um duplo papel estratégico. O primeiro diz respeito à

sua condição peculiar de agente discursivo da globalização e do neolibera-

lismo. Não apenas legitima o ideário global, como também o transforma

no discurso social hegemônico, propagando valores e modos de vida que

transferem para o mercado a regulação das demandas coletivas. A doxa

neoliberal procura neutralizar o pensamento crítico, reduzir o espaço para

ideias alternativas e contestadoras, ainda que estas continuem se mani-

festando, resistindo e reinventando-se.

A mídia se apresenta como intérprete da vontade geral, não se

sabe apoiada em que fundamento crível. Que eu saiba, os meios não têm

mandato ou delegação popular para apresentar-se como intérpretes dos

anseios de seus leitores, ouvintes e telespectadores. Claro que é uma

mistificação; a mídia é intérprete de suas próprias vontades e interesses,

sobretudo os de natureza econômica, política e ideológica, e quer perma-

necer até a eternidade interferindo na definição de valores.

O segundo papel exercido pelos conglomerados de mídia é o de

agentes econômicos globais. Eles obtêm expressiva lucratividade explo-

8 “Fundador do

El País

considera ‘inevitável’ a concentração dos meios de comunicação”, Agência Lusa, Lisboa, 15 de

maio de 2008, disponível em

http://noticias.sapo.pt/lusa/artigo/e921d69ea202bb646dfde8.html.