

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 453 - 458, jan - fev. 2015
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bastavam a violência e o terror do Estado, era preciso tornar a sociedade
imune a transformações uniformizando-a. Era preciso dominar a consci-
ência de uma parte da sociedade para excluir a outra parte.
Domina-se uma consciência operando com a ideia de verdade.
Uma visão de mundo, um interesse de classe, um ponto de vista, a ideia
de conservação, todo o ideário reacionário torna-se “verdade”. Particu-
larmente no caso do nazismo isto se deu por uma certa apropriação do
Romantismo filosófico. A base do Romantismo era uma ruptura com a
ideia usual de verdade. A noção clássica consistia em uma consciência
que “capturava” a verdade, como se fosse, por assim dizer, uma máquina
fotográfica. No Romantismo o eu é o sujeito criador da verdade. Ele a cria
como um artista “cria do nada”. E o espírito assim livre passa a ser senhor
absoluto do dever ser. Quando está apenas submetido às leis necessá-
rias da natureza o espírito está morto. Quando faz suas próprias regras o
espírito está vivo. É desse modo que o romantismo sai das entranhas do
Iluminismo como o oitavo passageiro de Allien.
Para Fichte, escrevendo em plena invasão napoleônica, esse eu
criador era o povo alemão. Fichte inspirou o
volkisch
, movimento que
grassou na Alemanha no século XIX.
Volkisch
significava mais ou menos
poder do povo, espírito do povo, mas com uma conotação étnica. Abar-
cava o sangue, a tradição, a pátria, o ambiente, a terra e, permeando isso
tudo, a etnia. O filósofo romântico dizia que o povo alemão emanciparia a
humanidade. Lançaria “massas rochosas de pensamentos” sobre os quais
“eras vindouras construiriam suas moradas”. O espírito alemão era uma
“águia cujo poderoso corpo se impele ao alto e paira sobre asas fortes e
experientes no céu para poder ascender para perto do sol, de onde ele
gosta de observar”. (
Discursos à Nação Alemã
)
Isto incorpora-se de algum modo a uma parte da cultura alemã e
serve ao nazismo. O sujeito - o povo alemão - forja o dever ser. Tudo que
estivesse na perspectiva do povo alemão - entendido como
volkisch
, etni-
camente - seria bom e verdadeiro. Tudo que não estivesse seria mau, falso
ou “doença”. E a doença tem que ser exterminada.
O Estado nazista criou uma polícia e um processo penal
volkisch
.
Um historiador do nazismo os descreve assim:
“Esse tipo de polícia “volkisch”, ou biológica, da polícia foi
apresentado ao povo alemão como a base racional para o