

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 340 - 355, jan - fev. 2015
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que as diferenças devem ser extraídas”.
19
Prado pensa desde a perspec-
tiva de princípio acusatório como fundante do sistema acusatório, pois
embora considere que há grande coincidência entre princípio dispositivo
e acusatório, aponta que princípio dispositivo significa permissão para dis-
por sobre o objeto do processo em tramitação, não sendo caracteristica-
mente acusatório ou inquisitório.
20
Rui Cunha Martins levou ainda mais longe a discussão sobre o prin-
cípio unificador do sistema, apontando que a obsessão pela verdade dos
fatos do sistema inquisitório optava por confiar a gestão das provas a
um magistrado pouco dado a sutilezas de ordem tensional.
21
Para Cunha
Martins, um sistema processual penal de viés constitucional só pode ter
um princípio unificador: a democraticidade.
22
A partir dessa definição,
Cunha Martins sustenta que a pergunta a ser feita a qualquer elemento,
mecanismo ou prática, seja de que tipo for, desde que atuante na esfera
do sistema processual, é a seguinte:
é este mecanismo ou elemento, ou
prática seja de que tipo for, compaginável com o cenário democrático-
constitucional regente do próprio sistema em que ele se insere?
Para o
autor, é essa questão que verdadeiramente interessa colocar em perma-
nência.
23
Cunha Martins considera que a democraticidade – tal como pro-
duzida pelo patamar político-constitucional – deve ser concebida como
19 PRADO, Geraldo.
Sistema acusatório:
a conformidade constitucional das leis processuais penais. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2006, p. 106.
20 PRADO, Geraldo.
Sistema acusatório:
a conformidade constitucional das leis processuais penais. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2006, p. 115. O autor considera que no processo inquisitório, nada impede que o juiz/acusador desista
do processo e o encerre mediante arquivamento, o que não transformará o processo inquisitório em acusatório. Já
no processo acusatório, o juiz não pode condenar o réu diante de um requerimento/alegação final do acusador em
que seja pedida absolvição, sob pena de ofender o contraditório. PRADO, Geraldo.
Sistema acusatório:
a conformi-
dade constitucional das leis processuais penais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 118.
21 CUNHA MARTINS, Rui.
O ponto cego do direito:
the brazilian lessons
. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 93.
22 De acordo com o autor, “Em bom rigor, o sistema processual de inspiração democrático-constitucional só pode
conceber um e um só “princípio unificador”: a democraticidade; tal como só pode conceber um e um só modelo
sistêmico: o
modelo democrático
. Dizer “democrático” é dizer o contrário de “inquisitivo”, é dizer o contrário de
“misto” e é dizer mais do que “acusatório”. Inquisitivo, o sistema não pode legalmente ser; misto também não se vê
(porque se é misto haverá uma parte, pelo menos, que fere a legalidade); acusatório, pode ser, porque se trata de
um modelo abarcável pelo arco de legitimidade. Mas só o poderá ser à condição: a de que esse modelo acusatório
se demonstre capaz de protagonizar essa adequação. Mais do que acusatório, o modelo tem que ser democrático.
A opção por um modelo de tipo acusatório não é senão a via escolhida para assegurar algo de mais fundamental
do que ele próprio: a sua bandeira é a da democracia e ele é o modo instrumental de a garantir. Pouca virtude
existirá em preservar um modelo, ainda que dito acusatório e revestido, por isso, de uma prévia pressuposição de
legalidade, se ele comportar elementos susceptíveis de ferir o vínculo geral do sistema (o tal “princípio unificador”:
a democraticidade), ainda quando esses elementos podem até não ser suficientes para negar, em termos técnicos,
o caráter acusatório desse modelo. Não é o modelo acusatório enquanto tal que o sistema processual democrático
tem que salvar, é a democraticidade que o rege”. CUNHA MARTINS, Rui.
O ponto cego do direito:
the brazilian les-
sons.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 93-94. Grifos do autor.
23 CUNHA MARTINS, Rui.
O ponto cego do direito:
the brazilian lessons.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 94.