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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 340 - 355, jan - fev. 2015

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1. Sistemas processuais penais

Adentrar a questão da definição acusatória, inquisitória ou mista

dos sistemas processuais conduz ao enfrentamento de uma das temáticas

mais polêmicas do processo penal, sobretudo pela discórdia quanto ao

elemento que propriamente caracteriza um sistema concreto dentro de

uma das espécies referidas. Jacinto Nelson de Miranda Coutinho definiu

o que propriamente significa sistema, em seu sentido jurídico-processual:

“conjunto de temas jurídicos que, colocados em relação por um princípio

unificador, formam um todo orgânico que se destina a um fim”.

8

Para Cou-

tinho, o princípio dispositivo e o princípio inquisitório dão sustentáculo

ao sistema acusatório e ao sistema inquisitório, respectivamente: não há

propriamente um terceiro sistema, que possa ser tido como misto, como

alguns extraem a partir de uma leitura legitimante do Código de Processo

Penal de 1941.

9

Desse modo, a partir da noção de princípio unificador,

Coutinho sustenta que o dito sistema misto é um sistema essencialmente

inquisitório. Para o autor, “o sistema processual penal brasileiro é, na sua

essência, inquisitório, porque regido pelo princípio inquisitivo, já que a

gestão da prova está, primordialmente, nas mãos do juiz”.

10

Desde essa

perspectiva, como o critério final de definição é a gestão da prova, o sis-

tema brasileiro acaba sendo maculado por esse caráter inquisitório.

11

Em concordância, Lopes Jr afirma que a separação inicial das funções de

acusar e julgar não é o núcleo fundante dos sistemas e, portanto, é insu-

ficiente para sua caracterização.

12

Como observa o autor, ainda que a se-

8 COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. "O papel do juiz no processo penal".

In

: COUTINHO, Jacinto Nelson de

Miranda (coord.)

Crítica à teoria geral do direito processual penal.

Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 16.

9 Como indica o autor, “salvo os menos avisados, todos sustentam que não temos, hoje,

sistemas puros

, na forma

clássica como foram estruturados. Se assim o é, vigoram sempre

sistemas mistos

, dos quais, não poucas vezes,

tem-se uma visão equivocada (ou deturpada), justo porque, na sua

inteireza

, acaba recepcionado como um terceiro

sistema, o que não é verdadeiro. O dito

sistema misto

,

reformado

ou

napoleônico

é a conjugação dos outros dois,

mas não tem um princípio unificador próprio

, sendo certo que ou é

essencialmente inquisitório

(como o nosso),

com algo (características secundárias) proveniente do sistema acusatório, ou é

essencialmente acusatório

, com alguns

elementos característicos (novamente secundários) recolhidos do sistema inquisitório. Por isto,

só formalmente pode-

mos considerá-lo como um terceiro sistema

, mantendo viva, sempre, a noção referente a seu

princípio unificador

, até

porque está aqui, quiçá, o ponto de partida da alienação que se verifica no operador do direito, mormente o proces-

sual, descompromissando-o diante de um atuar que o sistema está a exigir ou, pior, não o imunizando contra os vícios

gerados por ele”. COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. "O papel do juiz no processo penal."

In

: COUTINHO, Jacinto

Nelson de Miranda (coord.)

Crítica à teoria geral do direito processual penal.

Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 16.

10 COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. "Introdução aos princípios gerais do processo penal brasileiro".

In:

Revis-

ta de estudos criminais n.1

. Porto Alegre: Notadez Editora, 2001, p. 29.

11 COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. "Glosas ao verdade, dúvida e certeza, de Francesco Carnelutti, para os

operadores do Direito".

In:

Anuário Ibero-americano de direitos humanos

. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 185.

12 LOPES JR, Aury.

Direito processual penal e sua conformidade constitucional

. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 67.