

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 340 - 355, jan - fev. 2015
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paração das funções de acusar e julgar seja uma característica importante
do sistema acusatório, não basta que essa separação seja apenas inicial,
deixando o magistrado livre para assumir papel ativo na busca da prova e
praticando atos típicos da parte acusadora.
13
É importante deixar claro que o que está em jogo nessa definição
não é uma mera etiqueta acadêmica: a concessão de poderes para que
o juiz produza provas representa uma porta aberta para o decisionismo
e para a reprodução da patologia inquisitória; como afirma Coutinho,
“abre-se ao juiz a possibilidade de decidir antes e, depois, sair em busca
do material probatório suficiente para confirmar sua versão, isto é, o
sistema legitima a possibilidade da crença no imaginário, ao qual toma
como verdadeiro”.
14
Como bem refere Lopes Jr, atribuir poderes instru-
tórios a um juiz – em qualquer fase – é um grave erro, que acarreta a
destruição completa do processo penal democrático.
15
Afinal, não se pode
supor que o juiz seja alheio a paixões humanas e que ele não tenha uma
hipótese que, mesmo inconscientemente, possa tentar provar caso lhe
seja atribuída a iniciativa da investigação.
16
Quando isso ocorre, como diz
Lopes Jr, “a verdade não é construída pela prova e a instrução, senão que
vem dada pelo juiz a partir de sua escolha inicial”.
17
Não é diferente a
posição de Geraldo Prado, que afirma que quando o juiz “[...] se dedica a
produzir provas de ofício se coloca como sujeito ativo do conhecimento
a empreender tarefa que não é neutra, pois sempre deduzirá a hipótese
que pela prova pretenderá ver confirmada”.
18
O autor refere que “a cons-
trução teórica do princípio acusatório há de consumar-se mediante opo-
sição ao sistema inquisitivo. São antagônicas as funções que os sujeitos
exercem nos dois modelos do processo. É desse antagonismo, portanto,
13 LOPES JR, Aury.
Direito processual penal e sua conformidade constitucional
. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 70.
14 COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda." Introdução aos princípios gerais do processo penal brasileiro".
In
:
Revis-
ta de estudos criminais n. 1
. Porto Alegre: Notadez Editora, 2001, p. 37.
15 LOPES JR, Aury.
Introdução crítica ao processo penal:
fundamentos da instrumentalidade garantista. 2ª ed. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 173.
16 Lopes Jr ressalta que “ademais, a busca da verdade substancial, mediante uma investigação inquisitiva, mais
além dos limitados recursos oferecidos pelo respeito às regras processuais, conduz ao predomínio das opiniões
subjetivas, e até aos prejulgamentos irracionais e incontroláveis dos julgadores. O arbítrio surge no momento em
que a condenação e a pena dependem unicamente da suposta sabedoria e eqüidade dos juízes”. LOPES JR, Aury.
Introdução crítica ao processo penal:
fundamentos da instrumentalidade garantista. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2005, p. 48.
17 LOPES JR, Aury.
Introdução crítica ao processo penal:
fundamentos da instrumentalidade garantista. 2ª ed. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 264.
18 PRADO, Geraldo.
Sistema acusatório:
a conformidade constitucional das leis processuais penais. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2006, p. 141.