

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 330 - 339, jan - fev. 2015
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impossibilidade de defesa de posicionamentos do que, menos, a possibili-
dade de múltiplos ideários serem, a princípio, defendidos.
Quando surgem propostas que pugnam por uma ação descarada e
assumidamente
afirmativa
(como, por exemplo, a dos debates sobre as
cotas raciais
e o equilíbrio que elas querem, incipientemente, ajudar a
construir), o operador-jurídico-
médio
entra em pânico e destila verborra-
gia sobre ‘isonomia’ e sobre testes científicos que comprovam a ‘igualda-
de de raças’ e sobre a – antídoto supremo da
homeostase
–
meritocracia.
Quando eclodem debates sobre a questão de gênero e o entorno social
e contextual da Lei n. 11.340/06 (“Maria da Penha”), o operador-jurídico-
-
médio
se esforça em reafirmar a Constituição contra os próprios ideais
constitucionais e propõe a inaplicação de alguns dispositivos da lei que
‘ferem a igualdade’ entre homem e mulher – o contato dos
homeostatas
com a realidade parece ser mediado por uma janela embaçada (
janela
quebrada
?), ou pela televisão – sintonizada em um canal
ruim
. No instante
em que o debate recai sobre união afetiva
homo
,
poli
ou qualquer prefixo
sexual
que difira do padrão que ele se acostumou a sedimentar como ‘ver-
dadeiro’, um show de horrores argumentativo deságua até mesmo em um
termo do preâmbulo constitucional que justificaria de forma canhestra a
adoção de
um
parâmetro religioso pelo Estado, ignorando todo o conte-
údo material e principiológico restante – bom lembrar, diante do texto
estapafúrdio do parágrafo 3º do art. 226 da Constituição Federal, que o
ideal
homeostata
acredita, contraditoriamente, que toda e qualquer coi-
sa do texto da
carta magna
pode ser livremente
emendado
por critérios
majoritários
de opinião pública. Lógico: a profusão do termo “cláusulas
pétreas” no seu discurso varia conforme o tema que está em ‘discussão’.
Na seara jurídico-penal, o visível e sensível direcionamento (
dirigis-
mo
) constitucional para um processo penal de bases
anti-inquisitoriais
(e
os motivos e
intenções
político-legislativas que decorrem disso de modo
incontestável) não é argumento que baste para que, sempre que possível,
o operador-jurídico-
médio
vise a sua ‘ponte de ouro’: a pedra fundamen-
tal da
homeostase
crê na ideia de
equilíbrio
como disfarce tosco para sua
defesa francamente ideológica de ideologias que se
aceitam
e se
revelam
enquanto tal. O operador-jurídico-
médio
de nosso tempo é
viciado
como
um dado de cassino: quando chega ao limiar da tomada de
partido
, da
assunção de
lado
, do embarcar em uma
proposição
, simplesmente en-
tra em curto-circuito e passa, como uma matraca, a destilar argumentos