

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 291 - 305, jan - fev. 2015
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das abordagens policiais aos pacientes. Admissibilidade. As abordagens
policiais vem sendo dirigidas de modo arbitrario contra mendigos e mo-
radores de rua da Comarca de Franca, sem que sejam observados os pre-
ceitos legais para tanto, violando a liberdade de locomoço dos pacientes,
o que por si só
já
autoriza a concessao do
writ
. Convalidada a liminar, or-
dem concedida. Alega-se, ainda, a inconstitucionalidade da contravenço
penal de vadiagem, prevista no artigo 59 do Decreto-lei 3.688/41, ao ar-
gumento que nao foi recepcionado pela CF/88 – Questão prejudicial ao
mérito do pedido nesta parte. A questao deve ser submetida a julgamento
pelo Órgao Especial desta Corte, conforme clausula de reserva de plenario
inserta no art. 97 da Constituiço Federal, arts. 481 e ss. do Codigo de Pro-
cesso Civil e Sumula Vinculante no 10. Incidente de inconstitucionalidade
instaurado, com remessa ao Colendo Órgao Especial para apreciaço”.
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Assim, após serem acusados de contravenção penal de vadiagem,
os cidadãos em situação de rua em Franca foram condenados, mas não às
penas de 15 dias a 3 meses de prisão simples, e sim à liberdade, ou seja, a
serem livres e a realizar o projeto existencial que melhor lhes aprouver.
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Como o paradigma político da exceção e do campo circula, sugere-se e
entranha-se por toda a sociedade, com ameaça, ante a possibilidade de
seu eterno retorno, de novas catástrofes e tragédias para a vida de ho-
mens de carne e osso e, para a própria liberdade ontológica que lhes é
patrimônio comum, resta agora o exercício do dever ético da permanente
vigilância para poder resistir aos processos de dessubjetivação que estão
por vir, não se olvidando aqueles que estão sendo levados a cabo agora e
que ainda são imperceptíveis.
32 O incidente de inconstitucionalidade instaurado ainda não foi objeto de julgamento, de modo que a questão
acerca da não recepção da contravenção penal de vadiagem pela Constituição da República ainda não foi definitiva-
mente dirimida pelo Tribunal de Justiça.
33 Na filosofia existencialista de Jean-Paul Sartre, “o homem está condenado a ser livre”. Cf.
O existencialismo é
um humanismo
. Trad. João Batista Kreuch. Petrópolis: Vozes, 2010. p. 33. Evidentemente, como bem alertou David
Sanchez Rubio, no referido correio eletrônico, em razão da extrema vulnerabilidade social das pessoas em situação
de rua, é fundamental que lhes sejam realizados e garantidos direitos humanos fundamentais para que possam
escolher, com dignidade, seu projeto existencial. Nessa esteira, há que se ressaltar que após o Seminário “População
em situação de rua e políticas públicas”, realizado no dia 22 de novembro de 2012 na cidade, com o apoio da Escola
da Defensoria Pública e da Escola Superior do Ministério Público, graças ao apoio do promotor de justiça da área dos
direitos humanos, Paulo César Correa Borges, o município de Franca aderiu à “Política Nacional para a População em
Situação de Rua” e inaugurou em 11 de setembro de 2013 o Centro de Referência Especializado para a População
em Situação de Rua (CENTRO-POP).