

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 291 - 305, jan - fev. 2015
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A permanecer o estado de exceção, o processo de dessubjetivação
atingiria até mesmo Jesus Cristo e Buda, esteios das grandes religiões mo-
noteístas, seminais para o desenvolvimento das civilizações ocidental e
oriental, consoante as reflexões de Zaffaroni,
25
assim como os filósofos
cínicos da Antiguidade grega, para quem a verdadeira vida, pura, sobe-
rana e autossuficiente, seria uma vida outra, para cuja realização seria
fundamental o exercício da pobreza ativa com a procura incessante de
despojamentos possíveis, ou seja, uma conduta efetiva de vivência na pe-
núria de maneira física, material e efetiva, para além da simples aceitação
da pobreza, do que resulta a exaltação da vida nua, mendicante, bestial,
de impudor, de despojamento, de animalidade.
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Não obstante, ao pedido de liminar posicionou-se contrariamente o
Ministério Público, em parecer da lavra do promotor de justiça Murilo Cé-
sar Lemos Jorge: “Pelo que se percebe não há nos autos notícia de injusta
coação ou ameaça de lesão contra os pacientes, uma vez que a suposta
‘ordem’ determinada pelo MM. Juiz de Direito da Vara de Execuções Crimi-
nais não apresenta qualquer ilegalidade, pois em absoluta conformidade
com a legislação vigente, uma vez que é dever do agente público respon-
sável pela segurança da população agir quando verificada uma situação de
flagrante delito. Ademais, não se tratou na verdade de ordem, mas sim de
uma orientação, uma cobrança aos policiais militares do município para que
intensifiquem suas ações”. Da mesma forma, o entendimento do judiciário,
eis que no dia 30 de maio, o juiz de direito presidente do Colégio Recursal,
Humberto Rocha, denegou o pedido liminar: “Nesta fase de cognição su-
mária em que o procedimento se encontra, não ausculto qualquer violação
de direitos do paciente a recomendar, nesta fase, trancamento ou outra
providência a ensejar a suspensão do procedimento”.
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Diante do indeferimento da liminar, em 1
o
de junho, a Defensoria
Pública impetrou outro
habeas corpus
coletivo no Tribunal de Justiça de
São Paulo.
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Em decisão do desembargador Paulo Antonio Rossi, o judiciá-
25 “Não é difícil imaginar Cristo ou Buda condenados por ‘vadiagem’ e, na pior das hipóteses, ‘desaparecidos’ por
terem atentado contra a segurança nacional”. ZAFFARONI, Eugenio Raúl.
Em busca das penas perdidas
: a perda de
legitimidade do sistema penal. Trad. Vânia Pedrosa; Amir da Conceição. 5. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2001. p. 148.
26 “A pobreza cínica (...) é a afirmação do valor próprio e intrínseco da feiura física, da sujeira, da miséria. Isso é
importante e introduziu, ao mesmo tempo na ética, na arte da conduta e, infelizmente, também na filosofia, valores
da feiura a que elas nunca renunciaram”. FOUCAULT, Michel.
A coragem da verdade
: o governo de si e dos outros II.
Trad. Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 2011. p. 228-238.
27 Conferir páginas 109/111 do processo n. 12/12 do Colégio Recursal da Comarca de Franca.
28
Trata-se do processo n. 0115880-26.2012.8.26.0000, da 12
a
Câmara de Direito Criminal
(http://esaj.tjsp.jus.br/cpo/sg/search.do?paginaConsulta=1&localPesquisa.cdLocal=4&cbPesquisa=NUMPROC&tipoNuProcesso=UNIFI-