

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 243 - 255, jan - fev. 2015
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O neopunitivismo não está relacionado com estatísticas (em certos
casos, como os homicídios em SP, é ele precisamente quem produz as
elevações). Tem a ver com os objetivos do mercado, este novo Leviatã, de
não mais explodir simplesmente o Estado, mas sim de se apropriar dele.
Lois Wacquant nos explica como este novo punitivismo usa a mão
direita forte para compensar o enfraquecimento da mão esquerda no
estado social
4
.
Jonathan Simon atribui ao movimento a ideia de governança atra-
vés do crime, pelo qual a sociedade norte-americana trocou a figura cen-
tral do cidadão e consumidor para a da vítima, inclusive pela maior faci-
lidade de lidar com expectativas populares mais alcançáveis (e baratas)
do que a recuperação do new deal
5
. O endurecimento penal é, enfim, o
populismo de direita.
Nesta governança contra o crime, revela o estudo de Simon, cresce
vertiginosamente o poder do Ministério Público (fortemente atuante na
política norte-americana) ao mesmo tempo em que enfraquece o do juiz
–cujo desprestígio é crescente, especialmente pela ideia de que a neutra-
lidade equivale à impunidade.
A mídia não está nesta barca à toa. Nem apenas por uns trocados.
Mas para entender isso é preciso se desprender daquela visão idíli-
ca do jornalista liberal em busca da verdade contra o poder e os podero-
sos, como um Quixote redivivo.
A grande mídia é hoje cada vez mais concentrada e não apenas é
financiada pelas, mas é em si mesma, uma grande corporação.
Embora clame por ser representante do “interesse público” ou por-
ta-voz da “opinião pública”, jamais deixa de ser empresária atuante na
defesa do conjunto de valores de classe.
E, como tal, realiza com frequência uma crítica exacerbada ao setor
público, poupando quase sempre o privado (mesmo quando poderoso,
como bancos).
Tudo que é do Estado é errado, custoso, opressivo, ineficiente e pesado
-salvo o Direito penal, que, ao contrário, é tolerante, fraco, permissivo, frouxo.
Busca-se quase sempre salvar o indivíduo do Estado, e ao mesmo
tempo, a sociedade do indivíduo (através da ideia de cidadania para uns
e não para outros).
4
Punir os pobres. A nova gestão da miséria nos Estados Unidos
. Ed. Revan, 2007, p. 30.
5
Governing through crime.
Oxford University, 2007 [e-book]