Background Image
Previous Page  251 / 590 Next Page
Basic version Information
Show Menu
Previous Page 251 / 590 Next Page
Page Background

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 243 - 255, jan - fev. 2015

251

A consagração da repressão como última esperança da

civilização

Zaffaroni já havia nos advertido da sobrevida da Idade Média.

O Malleus Maleficarum, manual de martírio às bruxas continha, na

sua estrutura, a gênese de grande parte desse salvacionismo Lei e Ordem.

A criminalidade que se expande sem limites, o inimigo que precisa

ser abatido frontalmente, o remédio amargo que é o único necessário, a

conduta nociva de quem não adere ao punitivismo

2

. Tudo já estava lá des-

de 1484. Mas o neopunitivismo tem-se vitaminado nas últimas décadas nos

escombros dos estados de bem-estar. A mídia é o seu mais eficaz portador.

Os antigos jornais espreme-sangue não são mais discriminados

como lixo. Suas matérias invadiram os espaços e publicações nobres, que

destacam generosas porções de suas edições para os crimes.

Os programas policialescos exageram na representação, mas o sen-

sacionalismo dos telejornais noturnos não se aparta muito deles. O pruri-

do que havia em

mostrar imagens fortes

desapareceu completamente e

as empresas de comunicação lidam com a estratégia de galvanizar, primei-

ro o sentimento, depois a opinião, acerca de uma multidão interminável

de crimes, que repetem todos os dias.

Estudo de Alex Niche Teixeira sobre programas policiais que retra-

tam situações reais de crimes concluiu:

“Estes programas produzem sua própria demanda por mais

e mais punição”

“Constroem uma forma de cidadania orientada pela descon-

fiança e pelo medo”

“No âmbito do controle criminal, este é o período em que

tanto nos EUA como na Inglaterra, se verifica uma forte ten-

dência de reorientação das políticas penais, as quais configu-

ram um endurecimento da ação punitiva do Estado”

3

.

Situação esta que não é nada diversa da atual realidade brasileira.

2 La Cuestión criminal. Ed. Planeta, 2012, p. 41/43.

3 “Televisão, hipercrimes e violências na Modernidade Tardia”,

in

Violência e Cidadania – Práticas Sociológicas e Com-

promissos Sociais.

Ed. Sulina, organizado por José Vicente Tavares dos Santos, Alex Niche Teixeira e Maurício Russo.