

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 212 - 220, jan - fev. 2015
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Ocorre, entretanto, que a resultante dessas ações excepcionais,
marcadas principalmente pela substituição da ação normativa democrá-
tica por uma ação arbitrária do Poder Executivo, justifica a violação de
direitos pela garantia de segurança. Contudo, este tipo de atuação esta-
tal tem demonstrado o descompasso entre o recurso retórico (discursos
declarados) e seus verdadeiros efeitos (discursos velados), isto porque as
medidas e métodos emergenciais de caráter “excepcional” tão somente
tem proporcionado uma atuação não só de maior intensidade qualitativa
(na rigidez do processo), mas também uma majoração quantitativa da po-
pulação encarcerada.
Este aumento dos índices de encarceramento é alcançado pela
implementação ‘justificada’ de políticas penais cada vez mais rígidas,
pela indiferenciação (ou relativização) dos Direitos Humanos, pela sele-
tividade primária e secundária, pelo aumento dos vínculos com o siste-
ma penal, enfim, por diversos instrumentos que visam não só o controle
social (por meio de técnicas e tecnologias de monitoramento), mas, sem
dúvida, a exploração econômica do medo ao encontro de espaços à ex-
pansão e acumulação do capital. É exatamente neste contexto que se
inserem as ações privadas de relativização dos Direitos Humanos
e até
mesmo de sua indiferença.
O caso do Golpe de 1964, no Brasil, por exemplo, mostra como os
militares romperam a ordem jurídica e social vigente e instalaram um
modelo autoritário, sob o manto da necessidade de impedir a ameaça
do comunismo. Foi o discurso da segurança novamente utilizado para
legitimar práticas autoritárias. As peripécias nefastas que assolaram o
Brasil nos 20 anos seguintes demonstraram a necessidade da retomada
do modelo democrático, muito embora se saiba que as práticas autori-
tárias não terminaram com a vigência do regime democrático. Este é o
ponto a que quero chegar.
Curioso entender e perceber os discursos legitimadores das prá-
ticas autoritárias no estado democrático. Uma figura híbrida de estado
democrático com suspensão temporária de direitos, em que o estado de-
mocrático serve para os momentos de paz e a suspensão dos direitos nos
momentos de crise. A vida democrática não permite o poder absoluto.
É preciso resistir. Contudo, mormente estejamos formalmente inseridos
numa sociedade democrática, convivemos com demonstrações diárias de
intolerância e práticas autoritárias, como a suspensão de direitos, convi-
vendo “harmonicamente” com o estado democrático.