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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p.212 - 220, jan - fev. 2015

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condutas por meio de um intenso processo de subjetivação constante na

produção e satisfação dos desejos. O princípio de mercado – característi-

ca fundante do capitalismo global – impõe padrões de consumo, ditando

e otimizando as promessas da modernidade, revelando que os intensos

processos de globalização somente podem ser mantidos se, e somente

se, estiverem também mantidos os pressupostos à violência estatal, isto

porque nas democracias de mercado tudo está centralizado no sujeito,

desde sua autonomia econômica, política, jurídica, até simbólica.

Para além das mais enfáticas demonstrações narcísicas da sociedade,

“as formas de destituição subjetiva que invadem as nossas sociedades re-

velam-se através de múltiplos sintomas: os colapsos psíquicos, o mal-estar

no campo cultural, a multiplicação de atos de violência e a emergência de

formas de exploração em vasta escala. Todos estes elementos são vetores

de novas formas de alienação e desigualdade” (Cf. Dufour, 2001, p. 1).

Aqui está o ponto de contato que pretendo analisar, isto porque

estas manifestações de barbárie apresentadas cotidianamente são exata-

mente os sintomas dos colapsos psíquicos contemporâneos, os quais nos

permitem identificar duas situações aparentemente paradoxais: tanto a

coexistência entre o Estado Democrático de Direito e o Estado de Exceção

no espaço geopolítico estatal, como também a possibilidade da vingança

privada, pois se naquela coexistência fática o Estado pode romper regras

diante de determinadas situações, acusar e julgar aprioristicamente pela

própria estrutura judicial e policial, sem o devido processo ou por decisão

midiática, o imaginário popular também cede e se traveste de justiceiro,

curiosamente sob o argumento de ausência daquele mesmo Estado. Nes-

tas situações o estado de exceção se torna a regra. Ele é permanente. Nas

palavras da Professora Vera Malaguti, é a adesão subjetiva à barbárie.

É neste sentimento de vazio e de ausência que nasce a barbárie

das guerras, da exploração do trabalho infantil e sexual, da precarização

da relação e dos direitos trabalhistas, surgindo com mais intensidade

um estado policial e não mais social, como consequência inevitável do

desenvolvimento do capitalismo. É possível, portanto, afirmar que existe

uma inflexão no contexto de nossa sociedade, justamente por conta do

estado de exceção recalcado no inconsciente da população, isto porque

as promessas da modernidade – em especial vida digna, paz e felicidade

– além de não terem sido satisfeitas, produziram o desejo e o medo da

insegurança de suas não realizações, não permitindo a necessária capaci-