

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 185 - 205, jan - fev. 2015
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mente atual a expressão cunhada por Foucault para ilustrar o Estado em
sua irresistível ânsia pela manutenção do
status quo:
o conceito de Estado
Policial, Estado Gendarme.
Nesta esteira, vale observar que o mundo contemporâneo tem se
caracterizado por um crescente recrudescimento nas medidas de contro-
le social institucionalizado em âmbito global. A atmosfera criada após o
atentado em 11 de setembro de 2001, nos EUA, com a edição do
U.S.A.
Patriot Act
- pacote de leis antiterrorismo que implicou na restrição de
direitos civis -, se reproduz em diversos países. A sensação pública de in-
segurança e medo dá ensejo ao incremento e expansão de doutrinas con-
servadoras e repressivas no que se refere ao sistema penal.
Neste contexto, Hassemer bem demonstra o caráter repressivo dos
atuais Movimentos de Lei e Ordem. Vai além, analisa, especialmente, a
experiência dos riscos e da erosão normativa que determinam nossa vida
cotidiana, provocando uma sensação de paralisia. De tal sorte que, o Es-
tado, antes um Leviatã, passa, consoante o autor, a ser concebido como o
“companheiro de armas dos cidadãos, disposto a defendê-los dos perigos
e dos grandes problemas da época”.
Assim, crescem as políticas criminais bélicas, os aparatos policiais, as
execuções sumárias, a profusão dos cárceres, a tortura como meio de ob-
tenção de prova, o Estado de Polícia, especialmente diante das vidas nuas.
Em contraponto, restringem-se os direitos e as liberdades individuais.
Diante da onda neoconservadora, o Estado Democrático de Direito
vê-se ameaçado pela expansão do Estado Policial, pois a busca da segu-
rança sobrepuja a luta pela liberdade, o discurso da segurança pública
ocupa o lugar do discurso de direitos humanos, privilegia-se a proteção de
poucos, em contraposição à proteção da coletividade. Dissemina-se a des-
politização da política, a exacerbação do individualismo, multiplicação das
desigualdades sociais, o medo e desprezo pelo outro. Assiste-se à passa-
gem do Estado Providência para o Estado Penal, através da criminalização
das consequências da miséria, segundo Wacquant
1
.
A sensação de medo enseja o discurso de combate às classes peri-
gosas, de combate aos inimigos públicos. Na perspectiva do poder cons-
tituído, os inimigos, os perigosos, são aqueles que de algum modo ame-
açam a ordem social excludente que busca se legitimar. Sejam as classes
sociais subalternas - aqueles que sobraram da sociedade de consumo
como diz Bauman -, sejam os movimentos de contestação desta ordem.
1WACQUANT, Loic.
Punir os pobres: a nova gestão damiséria nos Estados Unidos.
Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2001b.