

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 164 - 184, jan - fev. 2015
183
rão trazer outras variáveis no futuro para se avaliar que tipo de formula-
ção teórica e política pode conter uma manifestação desse tipo e quais
interesses representa para além dos problemas efetivos da sociedade bra-
sileira. A pregação dos jovens estimulados pelas entidades tem um caráter
anti-institucional e até mesmo golpista.
IV. Um objetivo maior: reinventar a democracia
Como se pode ver, são diversos os motivos apontados por especialis-
tas e intérpretes para as manifestações no Brasil e a resposta mais provável
seria a de que não há um único motivo, nem mesmo um conjunto fechado
de razões, mas trata-se de campo aberto de disputa por pautas, propostas e
projetos de transformação da sociedade brasileira.
Com o decorrer dos fatos e do tempo, talvez fique mais fácil analisar
especificamente as razões quemotivaramas manifestações de 2013. Aomes-
mo tempo, o calendário de protestos vem sendo construído por diversos ato-
res que prometem quebrar a rotina e a normalidade dos meses de 2014, ano
simbólico por tantos motivos e também ano eleitoral.
Talvez a característica premonitória dos protestos possa coincidir com
o que Žižek resumiu em artigo recente, “A caminho de uma ruptura global”
(Sul21, 03/07/13). Ao descrever omal-estar e o descontentamento fluido pre-
sente nas manifestações ao redor do mundo, aponta que os protestos atuais
lidam comuma combinação de aomenos dois problemas: umeconômico (da
corrupção à ineficiência do próprio capitalismo) e outro político-ideológico
(da demanda por democracia à demanda pelo fim da democracia convencio-
nal multipartidária). Em suma, o autor resume que os protestos indicam ser
necessário reinventar a democracia.
Segundo ele, “as revoltas de hoje são sustentados pela combinação
de demandas sobrepostas, e é aí que está a sua força: lutampor democracia
(“normal”, parlamentar) contra regimes autoritários; contra o racismo e o
sexismo, especialmente quando dirigidos contra imigrantes e refugiados;
contra a corrupção na política e nos negócios (poluição industrial do meio
ambiente etc.); pelo estado de bem-estar contra o neoliberalismo; e por
novas formas de democracia que avancem além dos rituais multipartidá-
rios. Questionam também o sistema capitalista global como tal, e tentam
manter viva a ideia de uma sociedade que avance além do capitalismo”.