

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 164 - 184, jan - fev. 2015
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Há um sentido de entender que a luta com a centralidade do traba-
lho, feita por sindicatos e partidos de esquerda, tentará manter o controle
sobre os manifestantes e o tipo de luta de engajamento que, pelas ca-
racterísticas já mencionadas, não se coaduna aos modelos hierárquicos e
de conquistas graduais e históricas dos partidos tradicionais. Os protestos
multidimensionais repudiam o conceito carismático de liderança e, como
tal, também tendem a subverter as bases sindicais e partidárias.
No Brasil não foi diferente. O cientista político Giuseppe Cocco, um
dos intelectuais que é contundente crítico do Partido dos Trabalhadores e
do governo, responde as acusações vindas de setores da esquerda parti-
dária de que aos movimentos de junho lhes faltaria organicidade, lideran-
ças e ‘projeto’. Cocco devolve a pergunta/acusação indagando qual seria a
organicidade e os projetos desses partidos. Para ele, que defende a força
dos protestos, é justamente na falta de organização formal e na multiplici-
dade das singularidades que jaz a força das manifestações, “sem lideran-
ças e, por isso, mais potentes”.
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Giuseppe Cocco questiona o papel atualmente assumido pelos par-
tidos tradicionais, que “parecem funcionar como coalizões espúrias de es-
tratégias personalistas, grupos de interesse econômico que formam ban-
cadas bem pouco ‘republicanas’ a partir do peso de determinados lobbies
(agronegócio, telecomunicações, evangélicos, etc.) que passam por cima
das próprias instâncias partidárias”.
O caso brasileiro reúne um componente atípico que é o fato de o
partido da Presidenta Dilma Rousseff ser um partido de esquerda, o Par-
tido dos Trabalhadores, fundado em 1980 e que representa um dos maio-
res movimento partidários de esquerda das Américas, possui mais de um
milhão e meio de filiados e é o segundo maior partido do país.
Os protestos e a transformação das narrativas e pautas nas sucessi-
vas manifestações de rua, críticas aos políticos de modo generalizado, en-
contram aí um ponto de ambiguidade, pois Dilma é também a sucessora
de Lula, das conquistas sociais mais importantes da história do país e que
impulsiona um modelo exitoso economicamente, prodigioso do ponto de
vista do desenvolvimento com transferência de renda e diminuição da po-
breza. Outro dado significativo é que hoje (05 de fevereiro de 2014) as
pesquisas indicam que Dilma seria reeleita com 60% dos votos válidos, ou
21 Entrevista concedida à
Revista do Instituto Humanitas da UNISINOS
.
http://www.ihuonline.unisinos.br/index.php?option=com_content&view=article&id=5308&secao=434.