

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 164 - 184, jan - fev. 2015
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cussão sobre o modelo ideal de urbanismo, temas amplos que incluíam
pautas locais e vivenciais.
O artigo do geógrafo David Harvey, “Territórios transversais”, publi-
cado no livro
Cidades Rebeldes
(Boitempo, 2013) problematiza a liberda-
de da cidade que se reduz ao direito a ter acesso ao que já existe e não
a transformá-la ou recriá-la. O tema da mobilidade, organização, sanea-
mento e ocupação das cidades vai além da competência burocrático-ur-
banística, alcançando a esfera individual e coletiva do tipo de cidade que
se quer para o tipo de pessoa que se quer ser e, como tal, “A liberdade de
fazer e refazer a nós mesmos e a nossas cidades dessa maneira é um dos
mais preciosos de todos os direitos humanos”.
O tema das cidades ganha voz nas ruas, especialmente no Rio de Ja-
neiro e em São Paulo. Outros autores destacaramo entrelaçamento de pau-
tas e agendas à questão urbana e ao tema da mobilidade e da vida privada,
como a questão dos megaeventos e suas lógicas de gentrificação e limpeza
social (Ver artigo da urbanista Ermínia Maricato “É a questão urbana, estú-
pido!”,
Cidades Rebeldes
, Boitempo, 2013) ou o processo excludente de ci-
dade e a militarização de território populares (artigo de Felipe Brito e Pedro
Rocha de Oliveira, “Territórios transversais” no mesmo livro).
Transversal a todas as pautas foram os protestos contra a repressão
policial durante as manifestações e a – mais uma vez comprovada – ne-
cessidade de reforma das instituições de segurança pública, com ênfase
na reforma ou até a extinção/substituição da polícia militar, que ainda re-
presenta uma das permanências autoritárias do regime ditatorial militar.
A ação policial com o fim de conter manifestantes recebeu duras crí-
ticas desde os primeiros protestos, não apenas pelo (mal) uso de armas
tidas como “não letais” (balas de borracha,
spray
de pimenta e outras) que
causaram danos graves à integridade física de alguns manifestantes, como
também pelas detenções arbitrárias e o uso de policiais infiltrados nos pro-
testos simulando situações de ilegalidade. Foi emblemática a prisão de cer-
ca de 60 manifestantes em São Paulo pelo “porte de vinagre”, usado como
forma de combater os efeito do gás lacrimogêneo e do
spray
de pimenta.
Também no Brasil, portanto, pela quantidade das pautas e de prota-
gonistas nos protestos, agudiza-se a característica da ambiguidade já des-
crita, de movimentos prematuros e ao mesmo tempo atuais; utópicos e
propositivos, embora insuficientes para criar estratégias de transformação.