

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 4, p. 37 - 60, Setembro/Dezembro 2017
43
uma condenação. A trilhar-se esse raciocínio, seria acertado dizer que se
25,2% dos que responderam ao processo em liberdade foram condenados
à prisão, houve erro ao não aplicar-se a eles prisão provisória, o que não
é verdade justamente porque requisitos para prisão processual são distin-
tos daqueles para a prisão penal.
Costuma-se alegar, ainda, que há excesso de presos provisórios por
decisões judiciais ilegais ou descabidas frente ao ordenamento jurídico.
Esse argumento, aliás, é deveras comum. Ora, como se saber, em grau
sólido, quantas dessas prisões são inequivocamente ilegais? O número de
reformas de decisões condenatórias (não há dados sobre decisões inter-
locutórias) colegiadas em matéria penal é insignificante (1,12%, conside-
rando-se decisões junto à competência do STF), o que levou, inclusive,
a Corte Maior a usar isso como um dos argumentos para a execução
provisória da pena, com prisão após a condenação (ou confirmação da
condenação) em segunda instância
3
. Trata-se de uma
terceira inverdade
conveniente
defender-se que há um excesso de presos provisórios – já que
não restou suficientemente provada em bases estatísticas satisfatórias.
Não só isso. Argumento atual e assaz de vezes repetido é o de que as
audiências de custódia serviriam para diminuir o número de prisões pro-
visórias
4
. Trata-se de uma afirmação sem qualquer base empírica.
Primeiro
,
porque não há estatística consistente (por um período razoável de tempo e
em um quantitativo de decisões pesquisadas) acerca do número de prisões
em flagrante não convertidas em prisões preventivas
anteriormente
à im-
3 Do voto do Ministro Luis Roberto Barroso: “Segundo dados oficiais da assessoria de gestão estratégica do STF, referen-
tes ao período de 01.01.2009 até 19.04.2016, o percentual médio de recursos criminais providos (tanto em favor do réu,
quanto do MP) é de 2,93%. Já a estimativa dos recursos providos apenas em favor do réu aponta um percentual menor,
de 1,12%. Como explicitado no texto, os casos de absolvição são raríssimos. No geral, as decisões favoráveis ao réu con-
sistiram em: provimento dos recursos para remover o óbice à progressão de regime, remover o óbice à substituição da
pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, remover o óbice à concessão de regime menos severo que o fechado
no caso de tráfico, reconhecimento de prescrição e refazimento de dosimetria”. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Dis-
ponível em:
«http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10964246», p. 33, nota de rodapé
6. Acesso em 10.04.2017. Mais à frente, frisa Sua Excelência: “Em verdade, foram identificadas apenas nove decisões
absolutórias, representando 0,035% do total de decisões (ARE 857130, ARE 857.130, ARE 675.223, RE 602.561, RE
583.523, RE 755.565, RE 924.885, RE 878.671, RE 607.173, AI 580.458). Deve-se considerar a possibili-
dade de alguma margem de erro, por se tratar de pesquisa artesanal. Ainda assim, não há risco de impacto relevante quer
sobre os números absolutos, quer sobre o percentual de absolvições”. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Disponível
em:
«http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10964246», p. 33, nota de rodapé 7. Aces-
so em 10.04.2017. O STF entendeu pela possibilidade de execução provisória após decisão da segunda instância no HC
126.292/SP, Pleno, rel. Min. Teori Zavascki, DJe-100 17.05.2016. Dito entendimento restou asseverado nos julgamentos
das ADCs n. 43 e 44 (acórdãos não publicados, julgados ambos em 05.10.2016, indeferindo-se as cautelares ali buscadas),
bem como no ARE 964.246 RG/SP (Pleno, rel. Min. Teori Zavascki, DJe-251 25.11.2016, reafirmando, em repercussão
geral, o entendimento do HC 126.292/SP).
4 JOTA. Audiências de custódia podem reverter o caos carcerário?. Disponível em:
«http://jota.info/justica/audiencias--de-custodia-podem-reverter-o-caos-carcerario-14012017». Acesso em 10.04.2017.