

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 4, p. 191 - 209, Setembro/Dezembro. 2017
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A prática do cartel
24
pode em tal cenário ser uma realidade em lo-
gradouros ou regiões com elevada concentração de agentes praticantes da
mesma atividade econômica, e nesse sentido, Municípios que não possuem
órgãos de regulação econômica estruturados podem ter dificuldades em pro-
mover o desenvolvimento uniforme de seu território, havendo claras assime-
trias entre bairros, regiões ou distritos.
O Estado brasileiro, conforme já delineado anteriormente, encontra-
-se em transição de uma social-democracia para um modelo neoliberal. Essa
virada político-ideológica, se mal conduzida no desenvolvimento de políti-
cas públicas, pode ser nociva para os consumidores, que ainda se reputam
como categoria vulnerável nas relações econômicas.
O Direito Concorrencial, sustenta-se, é um dos reflexos do Direito Eco-
nômico, em uma relação de gênero-espécie
25
. Nesse sentido, em busca do equi-
líbrio mercadológico, é de fundamental importância a atuação estatal no de-
senvolvimento de políticas públicas que impeçam práticas anticoncorrenciais
26
,
como o concerto de preços – tipo de cartel mais visualizado na prática forense.
O próprio STF já se manifestou acerca da possibilidade de exercício
do poder de polícia municipal na intervenção econômica: trata-se do enun-
ciado de súmula vinculante 38, que afirma ser “
competente o Município
para fixar o horário de funcionamento de estabelecimento comercial
”.
Os debates que resultaram na publicação da súmula vinculante 38
apresentam orientação por parte da corte suprema brasileira no sentido de
privilegiar a autonomia municipal no pacto federativo, o que diverge diame-
tralmente da orientação propugnada pela súmula vinculante 49. Nos termos
do documento que expõe os referidos debates,
in verbis
:
24 O cartel como infração à ordem econômica encontra-se previsto no art. 36, §3º, I da Lei 12.529/11 (Lei do Sistema
Brasileiro de Defesa da Concorrência),
in verbis
: “
Lei 12.529/11. Art. 36.
(…)
§3º. As seguintes condutas, além de outras, na
medida em que configurem hipótese prevista no caput deste artigo e seus incisos, caracterizam infração da ordem econômica: I - acordar, com-
binar, manipular ou ajustar com concorrente, sob qualquer forma: a) os preços de bens ou serviços ofertados individualmente; b) a produção
ou a comercialização de uma quantidade restrita ou limitada de bens ou a prestação de um número, volume ou frequência restrita ou limitada
de serviços; c) a divisão de partes ou segmentos de um mercado atual ou potencial de bens ou serviços, mediante, dentre outros, a distribuição
de clientes, fornecedores, regiões ou períodos; d) preços, condições, vantagens ou abstenção em licitação pública
”. Ademais, no plano federal
a celebração de acordo de leniência no âmbito do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) implica na
suspensão do prazo prescricional na prática de crimes diretamente relacionados à prática de cartel, nos termos do art. 87
da Lei 12.529/11.
25 O autor do presente estudo sustenta que o Direito Econômico, por se reputar como disciplina jurídica multifacetada,
fundamenta a existência de outros ramos da Ciência Jurídica como o Direito Concorrencial, o Direito Regulatório e o
Direito Penal Econômico, em verdadeira relação de gênero-espécie.
26 “
Muito se tem discutido a respeito da classificação do direito concorrencial como uma área do direito econômico. A partir do momento em
que, contemporaneamente, entendemos as normas antitruste como instrumento de implementação de políticas públicas, não podemos deixar de
colocá-las no contexto dos ‘instrumentos de que lança mão o Estado, na sua função de implementar políticas públicas’ e, portanto, do direito
econômico. Não obstante, visto sob outros prismas (complementares àquele do direito econômico, mas não excludentes), o direito antitruste pode
ser entendido como afeto ao direito comercial ou mesmo internacional
” (FORGIONI, Paula.
op. cit.
, p. 37).