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ARTIGOS

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Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 27, p. 17-24, 1º sem. 2017

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No Brasil, o Conselho Federal de Medicina editou a resolução

1.955/2010, definindo o transexual como “portador de desvio psicológico

permanente de identidade sexual, com rejeição do fenótipo e tendência

à automutilação e/ou autoextermínio”, contrariando sistemas mais avan-

çados, como o francês, que desde 2010 deixou de considerar a transexu-

alidade um transtorno mental, pioneirismo que tende a ser seguido pela

Organização Mundial de Saúde - OMS.

Vê-se, desse modo, que a cirurgia disciplinada pelo CFM representa uma

simples readequação do corpo à identidade de gênero, não havendo, tecnica-

mente, uma “mudança de sexo”, mas uma simples correção registral.

Dito de outro modo, busca-se apenas readequar o fenótipo à iden-

tidade de gênero, não se tratando a transexualidade de simples questão

sexual, tal como ocorre com a homossexualidade, ou mesmo associando-se

com o fetiche pelo travestismo, outra possibilidade incluída no grupo de

transgêneros, assim entendida toda forma de incompatibilidade entre a

identidade de gênero e o registro civil da pessoa.

III – Fundamentos civiL-constitucionais para a tutela da

identidade de gênero do transexual e a retificação do

nome e do gênero

Sabe-se que a dignidade da pessoa humana foi catapultada ao

status

de fundamento da República federal brasileira, de modo a reconhecer o

direito ao desenvolvimento pleno da personalidade jurídica e a tutela dos

conteúdos que compõem a dignidade: (i) autonomia, (ii) conteúdo intrín-

seco e (iii) conteúdo comunitário.

Para além da dignidade da pessoa humana (art. 1º, II, CF), outros va-

lores constitucionais sustentam a pretensão de retificação do nome e do

sexo: i) vedação a discriminação odiosa (art. 3, IV, CF); ii) igualdade (art. 5º,

CF); iii) privacidade (art. 5º, X, CF).

A interpretação conforme a Constituição não pode ser considerada

em termos absolutos e, muito menos, ser realizada de modo a-histórico,

em busca de verdades universais e imutáveis. Cabe ao intérprete, aban-