

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 1, p. 39 - 62, Janeiro/Abril 2018
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II. Os papÉis desempenhados pelas supremas cortes e
tribunais constitucionais
A missão institucional das supremas cortes e tribunais constitucio-
nais é fazer valer a Constituição diante de ameaças oferecidas pelos outros
Poderes ou mesmo por particulares. Na rotina da vida, a situação mais cor-
riqueira se dá quando determinada lei, isto é, um ato do Poder Legislativo,
é questionado em face do texto constitucional. Na grande maioria dos ca-
sos, ao exercer o controle de constitucionalidade, as cortes constitucionais
mantêm a legislação impugnada, julgando improcedente o pedido. Isto se
deve à primazia que a Constituição deu ao Legislativo para a tomada de
decisões políticas e à deferência que os tribunais devem aos atos dos outros
ramos do governo, em nome do princípio da separação de Poderes. Como
consequência, uma quantidade relativamente pequena de leis é declarada
inconstitucional.
É oportuna aqui a observação de que nos Estados Unidos a
judicial
review
é um conceito que, como regra geral, se restringe à possibilidade de
uma corte de justiça, e particularmente a Suprema Corte, declarar uma lei
(ou ato do Executivo) inconstitucional. Em outros países, sobretudo os de
Constituições mais analíticas, como Alemanha, Itália, Espanha, Portugal e
Brasil, a
jurisdição constitucional
, termo mais comumente utilizado, abri-
ga um conceito mais abrangente, que inclui outros comportamentos dos
tribunais, diferentes da pura invalidação de atos legislativos. Essas outras
atuações alternativas dos tribunais podem incluir: (i) a aplicação direta da
Constituição a determinadas situações, com atribuição de sentido a determi-
nada cláusula constitucional;
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(ii) a interpretação conforme a Constituição,
técnica que importa na exclusão de determinado sentido possível de uma
norma, porque incompatível com a Constituição, e na afirmação de uma
interpretação alternativa, esta sim em harmonia com o texto constitucional;
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e (iii) a criação temporária de normas para sanar hipóteses conhecidas como
de
inconstitucionalidade por omissão
, que ocorrem quando determinada
norma constitucional depende de regulamentação por lei, mas o Legislativo
se queda inerte, deixando de editá-la.
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2 Por exemplo: a liberdade de expressão protege a divulgação de fatos verdadeiros, não podendo ser afastada pela invo-
cação do chamado direito ao esquecimento.
3 Por exemplo: é legítima a reserva de vaga de um percentual de cargos públicos para negros, desde que sejam aprovados
em concurso público, preenchendo os requisitos mínimos estabelecidos.
4 Por exemplo: até que o Congresso aprove lei disciplinando a greve de servidores públicos, como prevê a Constituição,
será ela regida pela lei que disciplina a greve no setor privado.