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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 76, p. 86 - 93, out. - dez. 2016
mas, diante da complexidade gerada pela amplitude e dificuldades dos
casos nos quais não existe norma aplicável, alguns Juízes começaram a
se utilizar de suas subjetividades, dentre as quais até as suas convicções
religiosas, para julgar e assim promulgar sentenças que lamentavelmen-
te trouxeram muitos entraves de uma interpretação que por muitas das
vezes acabou violando os “Direitos Humanos”, e quando o objeto do foco
em questão é esse, necessário se faz apurar ainda mais esse entendimen-
to que, por muitas vezes, vai além do que imaginamos, devido à dinâmica
dos avanços até então. Neste caso, as boas publicações e artigos acadêmi-
cos e sentenças favoráveis são grandes aliados no entendimento e possi-
bilitam uma interpretação mais “coerente” com os dias atuais do século
XXI e consequentemente mais humana, na acepção da palavra.
Embora essa palavra “coerente” seja delicada de se empregar, te-
mos várias questões que muitas vezes não percebemos que são pano de
fundo de todo um cenário e que desejo aqui abordar.
Muitas vezes, não percebemos a dor que classifico como “
nadar
contra a maré”
das pessoas que passam pelo sofrimento para compreen-
derem quem são, pois ao se olhar no espelho e ao se tocar no momento
de se banhar, começam a perceber que algo está errado entre o senti-
mento e a percepção de fato “
body and soul
” e é aí que começa o que
considero a maior batalha de todas! A luta pela modificação corporal. Ao
mesmo tempo, começa o conflito dentro de casa, pois, infelizmente, a
maioria das famílias brasileiras ainda não compreendem esse fenômeno.
Sem mencionar o tradicionalismo, que também se reflete junto ao merca-
do de trabalho, sendo difícil lidar com essa questão.
E as lutas vão ficando cada vez mais acirradas e intensas, amplian-
do-se assim por uma guerra com inúmeras e infindáveis batalhas e, infe-
lizmente, algumas pessoas simplesmente morrem, ou, pressionadas por
seus familiares, voltam atrás nesse processo se tornando “criaturas sem
identidade”, pois vivem uma frustração sem precedentes.
As pessoas que conseguem forças para continuar essa árdua ba-
talha acabam chegando à porta do judiciário para finalmente realizar o
procedimento mais importante no que tange a vida social. Na mudança
de registro o que temos percebido dentro dessa caminhada dolorosa é
que alguns Magistrados têm descartado um conceito
“sine qua nom”
para
o entendimento em sua total amplitude: o “Gênero”. Essa palavra nos
traz um arcabouço de conhecimentos, entendimentos e novos conceitos