

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 75, p. 96 - 130, jul. - set. 2016
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ganha. O que significa dizer que, em situações onde há disparidade de
forças, a
pseudoconsensualidade
não passa de um arremedo para esvaziar
as prateleiras do Judiciário.
Com efeito, a retirada dos litígios de massa do sistema adjudica-
tório faz com que os
repeat players
57
não enfrentem as consequências
jurídicas de suas ações, já que o seu arbítrio não se submete a um sis-
tema equanime de aferição de responsabilidade. De um lado, o Direito
perde o posto de referencial normativo como paradigma decisório para
o consentimento viciado. E, de outro, a norma jurídica do caso concreto
deixa de ser a emanação da vontade geral - uma das principais conquistas
iluministas - para ser um ato formalmente consensual e substancialmente
coercitivo. Após salientar que “the future of access to justice, in the origi-
nal sense of granting equal opportunities to litigation for the rich and the
poor, seem quite grim”, Mattei afirma que:
"The birth of the ADR industry, and the development of a
professional class of mediators, not necessarily trained in the
law and serving the interests of harmony and non-adversary
social control, had transformed
the issue of access to justi-
ce, by limiting as much as possible access to courts of law.
This was accomplished by creating an alternative system not
based on justice but on harmony and, most importantly, a
system that was almost entirely privatized.
58
"
As críticas, como se percebe, são contundentes. Ao seu lume, po-
der-se-ia dizer que obviar os meios alternativos em qualquer modalidade
de conflito é a medida mais adequada. O Estado seria o melhor prestador
do serviço de distribuição de justiça. À consensualidade forjada preferir-
-se-ia sempre a justa adjudicação.
Quer nos parecer, entretanto, que Fiss e Mattei podem ser conci-
liados com Dinamarco e Watanabe. Mas, para tanto, excessos de ambas
as partes devem ser decotados. Não se trata de ser
contra
ou a
favor
dos
meios suasórios. Conforme dissemos, o Direito, como a vida em geral, não
se afina com
absolutos
. O de que se trata, portanto, é de precisar quando
a justiça alternativa é virtuosa, o que, conforme demonstrar-se-á no pró-
ximo tópico, depende de circunstâncias contingenciais.
57 Galanter, Marc. "
Why the “haves” come out ahead? Speculations on the limits of legal change".
Law and Society
Review
v. 9, 1974.
58
"Access to Justice..."
, p. 3.