

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 68, p. 28 - 59, mar. - mai. 2015
31
Para salientar as crises de instância da execução fiscal, inicialmente,
pontuo um repertório dogmático que remete a temática a um sintético divã
processual, predispondo as clássicas regras da LEF ao lado das recentes regras
do CPC reformado (pela Lei 11.382/06). Um exame comparativo entre pon-
tuais normas surpreende que a tendência das reformas processuais é para
acelerar (ou conferir efetividade) o trâmite dos procedimentos, desburocrati-
zando-os, além de afastar o vetusto absenteísmo técnico que separava o pro-
cesso de conhecimento do processo de execução (e também o depurava do
processo cautelar). Agora, não resolve dizer que uma determinada regra do
CPC reformado não se aplica à LEF, enquanto outra regra da mesma reforma
seria aplicável – necessário investigar o endereço das oscilações interpretati-
vas nesse diálogo das fontes.
Na era do sincretismo, o processo tende a ser (ou deve ser) somente
“um único” processo, no qual as suas diversas fases eventualmente se desdo-
bram na permanente busca da tutela do direito. O juiz não conhece para exe-
cutar, e não executa para conhecer, assim como o trabalho do intérprete não
2
pode ser absolutamente fragmentado em“conhecimento+interpretação”. No
contemporâneo mundo multimídia, multifacetado, multidimensionado, de
plurissignificados dinâmicos e coordenados, mormente o mundo da cultura,
não é a sociedade quem escolhe a sua tecnologia, mas é a tecnologia que
organiza a sua sociedade.
A efetividade (enquanto valor
3
) aponta para essa direção.
Nesses termos, o
conhecimento
, a
execução
e a
cautela
consistem em
fases da operação processual que se verticaliza à tutela dos direitos. A refle-
xão sobre essa matriz provavelmente desencobre algum porquê de algumas
crises de instâncias da execução fiscal. A pretensão não é desconstruir um
sistema, mas, de alguma forma, debater sobre uma interessante disputa: na
contratendência das recentes reformas do CPC, a execução fiscal segue como
um
continuum
de formalismo excessivo do direito tributário ou, ontologica-
mente, ela representa um jogo de cena que ornamentou o século XX.
Afinal, a execução fiscal não seria essas duas coisas?
2 A ciranda do “conhecer para interpretar e interpretar para conhecer” é automática e infindável. Não pode se auto-
-excluir, pois trata-se de fenômenos em constante coordenação, indeléveis à racionalidade humana.
3 A efetividade pode ser compreendida como um valor (o que é ótimo) ou como um princípio (plano deontológico).
O primeiro entendimento não deixa de ser pré-processual, atua no plano da política judiciária; o segundo, refere-
-se à disputa processual no sentido concreto, em vista dos objetos que o próprio processo afunila. A efetividade
se desenvolve em coordenação à segurança jurídica, seja como um valor ou seja como um princípio: no mundo da
cultura, os valores e os princípios coexistem. A grande diferença é o palco desse diálogo, uma questão delicada e
merecedora de aprofundamento. Ver OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro.
Do formalismo no processo civil
: proposta
de um formalismo-valorativo. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010,
passim
.