

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 88 - 104, jan - fev. 2015
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em mergulhar na guerra original, definitória das realidades da Ontologia.
A primeira palavra dessa negação é a afirmação do Outro absoluto
des-
de ele mesmo
apesar da impossibilidade de pensá-lo em termos radicais
da ontologia. Em outros termos: não é porque se pode, com muita di-
ficuldade, chegar a conceber na linguagem da ontologia uma realidade
a que se poderia chamar de “exterioridade absoluta” que esta exterio-
ridade absoluta adquire conteúdo, mas sim o contrário: é porque essa
exterioridade absoluta porta em si sua própria realidade que é possível,
apesar de todas as contradições em que inevitavelmente se cai, pensá-la
no reino do Ser, pois o pensamento é aqui absolutamente secundário à
presença «pensada». A referência do pensado não está no que o pensa,
mas na vida própria do pensado que não se afeta minimamente pelos
artifícios lógicos do pensamento
ontológico.
Evidencia-se uma completa
inversão do sentido da “intencionalidade”, um dos traços característicos
da metafenomenologia.
A guerra é agora impossível. Poderá haver a aniquilação ontológica
do Outro - talvez o acontecimento que nas grandes e pequenas histórias
mais se tenha repetido -, a corrosão violenta de sua “espessura ontológi-
ca”, mas não poderá haver uma luta de exércitos equivalentes, de forças
proporcionais, um diálogo de iguais. Agora não há mais proporção, ape-
nas a desproporção mais absoluta e radical, a assimetria pura e simples,
um primeiro elemento da reflexão metafenomenológica.
Observe-se que o surgimento do absolutamente outro, presença
sui generis
e incomparável, conserva em sua própria presença sua
distân-
cia infinita.
Esse aparecer, que significa uma traumática erosão dos esque-
mas compreensivos do Mesmo, conserva em si mesmo os parâmetros de
sua comparabilidade, não os cedendo a uma racionalidade equacionado-
ra. A linguagem do Outro, seu
Outro
discurso, é primariamente expressão
dessa incomparabilidade, a incomparabilidade de um outro espaço e de
um outro tempo, que evidenciam com seu aparecer a limitação do espaço
e do tempo do Mesmo. Para além do horizonte significativo do discurso
ontológico racional, conjugam-se assimetria absoluta e distância infinita
em uma mesma realidade externa, que paradoxalmente se expressa na
presença intrigante do Outro ao Mesmo. Elas caracterizam a subversão
metafenomenológica do conceito de espaço, transpondo a noção de es-
paço para o espectro ético da realidade.