

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 88 - 104, jan - fev. 2015
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to, ético. O trauma do encontro entre absolutamente diferentes convida à
aventura no reino de um futuro propriamente futuro, que nunca foi pre-
sente e que portanto
nunca foi resolvido
em seu sentido.
Fim dos tempos? Ou início de um tempo tão novo que não se deixa
subsumir na dialética dessa categoria? Isso não são sombras de um pas-
sado, mas vida da novidade
in statu nascendi
; não é a circularidade de
um tempo do eterno retorno ou de um modelo controlável, espacial, de
tempo, e sim a indefinição, imponderabilidade do que “ainda nem aca-
bou de iniciar”: realidade metafenomenológica possível de uma
história
ética
para além de qualquer fenomenologia da neutralidade dos tempos
domesticados.
O tempo da Totalidade, futuro que simplesmente se presentifica
ad
infinitum
, tempo do Mesmo, sofre assim pelo peso de uma antiguidade
infinita, de um tempo
irrecuperável
que a presença do absolutamente ou-
tro porta, essa antiguidade anárquica, em cuja presença anarquicamente
ética “nada será como antes”. É esse o sentido do tempo do Outro para
além de toda cronologia.
VIII.
O Mesmo é tocado pela presença do Outro na medida em que
uma guerra - ainda que uma guerra sutil, logicizada, suavizada por justi-
ficações - não pode ser iniciada. Se o horizonte máximo da visão do Ser é
o espaço no qual o ser pode divisar as perspectivas de sua completação,
onde o Ser entende suas necessidades de crescimento e tende a atendê-
-las, este campo de ação é agora invadido pela presença ética do Outro,
uma “des-necessidade” que, em não sendo um espaço lógico,
ocupa es-
paço
no horizonte de crescimento do ser. Este “ocupar espaço” não se
integra a lógica corrente da ocupação ou da usurpação: ele é de outra
ordem, como já visto, ele não se imiscui na teia do espaço ontologica-
mente preexistente. Ele é apenas convite,
contraste convidativo
, tradução
do trauma
inexplicado
em convite em abandonar a
physis
, o Heimat, a
polis ordenada do pensamento e mergulhar no
reino do desconhecido que
nunca foi conhecido
, nem na lógica positiva que atrela o desconhecido a
um futuro feito presente, para domesticá-lo oportunamente. É uma in-
clinação à estranheza, ao estrangeiro, a uma vida não contida na síntese
deste termo. Este é o
Désir
para o Ser:
o desejo que é esperança na não-
-esperança de completação
, subversão de ser. O desejo que não pode ser
completado - atribuição do Ser - e que por isso, e só por isso, pode ser