

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 88 - 104, jan - fev. 2015
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pode ser verdadeiro enquanto totalidade”
7
. A
in-totalidade
, a ‘infinitude’
da totalidade, significa
in-completação
, suspensão da dinâmica de com-
pletação, negação do “encontrar-se consigo mesmo” ínsito a todo proces-
so de totalização possível.
A Totalidade pressupõe, para existir, o encontro
com seus próprios limites –
o que é, obviamente, uma violência lógica:
nada que tenha limites pode ser a Totalidade
tout court.
Totalidade é, dessa forma, também
Ontologia
. E não se trata de
uma ontologia apenas sistematizante, pensada, mas da ontologia que
vem se dando na história da humanidade desde que a guerra deu à luz
o primeiro ser e de-finiu -
deu fim por primeira vez
- ao não-ser. Essa é a
ontologia que se identifica com a verdade da totalidade, a verdade da vi-
tória, a inteligibilidade do
ser que é
, e que encontra seus limites no
não ser
que ele define
. O desdobramento do ser através da história, a perseguição
do ser pela história, são o desabrochar ontológico original da Totalidade
em seu processo de redução do Outro ao Mesmo: “...a conquista do ser
pelo homem através da história...(é)...a redução do Outro ao Mesmo”
8
,
que subjaz a toda facticidade da barbárie em um sentido benjaminiano - o
qual Levinas compartilha de forma explícita com este autor
9
. Esta conquis-
ta acaba por conduzir indiretamente à realidade heterônoma do externo
à Totalidade. Talvez em nenhuma análise como aquela da morte seja esta
constatação tão evidente. A morte é o primeiro modelo de Alteridade, de
Exterioridade absoluta, e se constitui na fronteira exógena do Eu totali-
tário, limite da filosofia e do pensamento, primeiro e definitivo limite de
toda Totalidade fática, “impossibilidade de minhas possibilidades”, como
diz Levinas em oposição à formulação heideggeriana
10
.
IV.
O processo de percepção dos limites da Totalidade acima des-
crito sugere uma inversão da revolução copernicana que lança os re-
cursos filosóficos normais, a linguagem e a ordenação, em um limbo de
insuficiência. A consciência agora presente e clara da
inelutabilidade
do
encontro da Totalidade com seu fim -
exigido
por ela mesma enquanto
7 LEVINAS, E. “Totalité et totalisation”
in:
Encyclopédie Universelle
, Paris, 1973, v. 16, p. 192.
8 LEVINAS, E.
En découvrant l’existence avec Husserl et Heidegger
, Paris, 1974, p. 176.
9 “Toda civilização que aceita o ser, o desespero trágico que ele comporta e os crimes que ele justifica, merece o
nome de bárbara”(LEVINAS, E.
De l’Evasion
, Montpellier, 1982, p. 98).
10 A explanação da intuição básica da morte como limite da Totalidade se dá na primeira página do livro capital
de Franz ROSENZWEIG,
Stern der Erlösung
, fonte constante de inspiração para vários autores importantes do pen-
samento contemporâneo e que bem traduz a profundidade extrema de um pensador infelizmente praticamente
desconhecido no Brasil.