

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 39 - 53, jan - fev. 2015
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Neste local, emergiu um ente concebido como um verdadeiro “ope-
rador totêmico, quer dizer, um coágulo de ficções e fetiches, um conden-
sador significativo, um ”topos lógico” que mobiliza as crenças para a pro-
dução de desejos, poderes e saberes dominantes. ”
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O Estado como discurso de poder (do
mestre
) atua como produtor
de subjetividade. A construção dos desejos sociais que desembocará na
formulação de um imaginário punitivo e no dogma da pena como centro
nervoso do Estado Penal é fruto deste discurso oficial. Em uma ordem so-
cial e política democrática a situação do mestre é abalada e com ela todo
o saber destinado a manter a sua posição de poder
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. Produz-se um furo
nesta posição e disto resulta destituir o
líder
do seu status. Deste lugar, o
autoritarismo estatal balança.
Por isso, como afirmou Luis Alberto Warat
56
, “para fazer funcionar
uma sociedade democraticamente precisamos alterar as dimensões sim-
bólicas e o imaginário que consagra o Estado como uma instância de cen-
sura, do segredo e do silêncio”, o que só poderá ser feito denunciando a
existência declarada da falta. É sob o prisma das “ausências declaradas
pelo simbolismo manifesto do discurso” que deve ser entendida a ques-
tão. “Ausências e segredos que se pode começar a diagnosticar fazendo
presente as relações, que vêm sendo clarificadas pela Psicanálise, entre o
desejo, o saber e o poder”
57
.
A função paterna, concebida metaforicamente na
lógica da
castra-
ção
, possui uma inegável importância na formação do sujeito enquanto
estrutura, uma vez que ele se encontra à mercê da ordem simbólica. A
inscrição da Lei, trilhada pela autoridade paterna, é simplesmente im-
prescindível à sua constituição como ser desejante.
Isto não significa que precisamos de outro pai “suficientemente
mau”, a exercer o dever de sufocar os desejos singulares e impor outra
instância de censura, agora destinada a conservar os interesses daquele
que exerce o poder.
lização do Estado – a partir de um critério de unidade – no campo das dimensões míticas de significação, ou melhor
como uma forma fetichizada de representar o ‘outro cultural’. WARAT, Luis Alberto.
Introdução Geral ao Direito
.
A
epistemologia jurídica da modernidade
.
V. II. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 2002, p. 61.
54 WARAT, Luis Alberto.
Introdução Geral ao Direito
.
A epistemologia jurídica da modernidade.
Op. cit
. p. 61.
55 Mas, a considerar a observação de Gérard Pommier, é preciso estar atento, pois “abater o mestre em todo lugar
onde se apresenta, mesmo em si mesmo, é uma tarefa correlata à existência e, em relação a esta última, pouco
importa o ideal: o mesmo ideal aqui pode servir para sua queda e lá, para assentar seu domínio”. POMMIER, Gérard.
Freud Apolítico?
(trad. Patrícia Chitonni Ramos). Porto Alegre: Artes Médicas, 1989, p. 150.
56 WARAT, Luis Alberto.
Introdução Geral ao Direito.
A epistemologia jurídica da modernidade.
Op. cit.
p. 63.
57 WARAT, Luis Alberto.
Introdução Geral ao Direito
. A epistemologia jurídica da modernidade.
Op. cit.
p. 89.