Background Image
Previous Page  502 / 590 Next Page
Basic version Information
Show Menu
Previous Page 502 / 590 Next Page
Page Background

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 488 - 506, jan - fev. 2015

502

interna ao direito internacional está vinculada à possibilidade de liberta-

ção do eurocentrismo que o fundou:

Tomemos o exemplo do direito internacional. Por seus concei-

tos, ele é substancialmente europeu, mas ele carrega consigo

uma transformação do direito que permanece sempre perfec-

tível, portanto, inacabado. É preciso velar para que a parte eu-

ropeia desse direito internacional não venha limitá-lo afim de

que possamos liberar o direito de seus próprios limites eurocen-

tricos, sem, contudo, destruir a memória desse direito, porque

este permite e prescreve tambéma transformação, a perfectibi-

lidade infinita. Há, portanto, tambémaí uma tarefa de descons-

trução sem fim: deve-se elaborar na memória da herança as

ferramentas conceituais que permitam contestar os limites que

essa herança impôs até aqui [...]Do mesmo modo, se a filosofia

grega é europeia no princípio, mas sua vocação é universal, isso

quer dizer que ela deve se liberar do relativismo sem cessar. O

trabalho filosófico consiste em um ultrapassamento constante:

tudo fazer para reconhecer mas também para ultrapassar, sem

necessariamente trair, seu próprio limite etnocêntrico ou geo-

gráfico

(DERRIDA & ROUDINESCO, 2001, p. 39).

É importante notar que Derrida, assim como Habermas, conside-

ra o contextualismo, ou o que ele chama de relativismo na frase citada,

como o principal rival de uma concepção cosmopolita, internacional e

perfectívelmente universalista. No entanto, ao contrário de Habermas,

esse contextualismo ou relativismo está ligado para Derrida ao eurocen-

trismo que limita as iniciativas cosmopolitas do direito internacional e da

filosofia. Se a tarefa da Europa e do pensamento filosófico, democrático e

jurídico europeu foi um dia o de esvaziar o “contextualismo” travestido de

universalismo das religiões, o

dever

de uma espécie de Iluminismo hoje,

de um Iluminismo não eurocêntrico, segundo Derrida, será o de assumir a

tarefa de levar em consideração o contextualismo europeu de tal projeto,

travestido de universalismo irrestrito. Assim, Derrida afirma que o dever

das Luzes europeias hoje:

[...] manda tolerar e respeitar tudo o que não se coloca sob a

autoridade da razão. Pode se tratar da fé, de diferentes for-