

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 306 - 316, jan - fev. 2015
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3.3 – A posse de aparelho de telefonia celular –
nullum crimen, nulla
poena sine lege certa
A despeito da previsão expressa do princípio da legalidade na seção
que regula a disciplina na Lei de Execução Penal, a taxatividade nunca foi
uma característica presente na tipificação das faltas graves. De fato, a nor-
matização das faltas disciplinares na redação original da Lei de Execução
Penal se mostra nitidamente vaga e imprecisa, o que sempre deu azo ao
arbítrio durante o curso da execução penal no Brasil.
A única falta disciplinar de natureza grave adicionada ao texto
original da Lei de Execução Penal foi aquela trazida pela Lei Federal nº
11.466/07, que dispôs sobre a proibição da posse de aparelho telefônico
ou semelhantes. Ao contrário da normatização original da Lei de Execução
Penal, e sem adentrar na análise da legitimidade ou acerto do legislador
quanto à necessidade da inovação, a nova falta disciplinar observou de
maneira tardiamente pioneira a taxatividade penal. Com efeito, o tipo dis-
ciplinar demanda não só a posse, utilização ou fornecimento de aparelho
telefônico, de rádio ou similar, senão que exige também que o referido
aparelho tenha capacidade de comunicação com outros presos ou com o
ambiente externo.
Acostumados a um ambiente em que a legalidade jamais esteve
presente, os Tribunais não souberam lidar com o caráter taxativo da nova
norma disciplinar. Diante de um novo contexto que com atraso surgia, a
possibilidade de extensão aos demais tipos disciplinares da garantia da ta-
xatividade se apresentava como uma esperança de contenção do arbítrio
que rege a execução penal. Entretanto, diante do caminho que se abria,
optou-se pelo retorno às velhas concepções inquisitoriais.
A interpretação que se consolidou nos Tribunais Superiores ignorou
por completo a taxatividade da norma: para aplicação da falta disciplinar
dispensou-se até mesmo a necessidade de se tratar de aparelho e, por
consequência, de sua capacidade de comunicação
14
. Ainda que a previsão
legal tenha sido taxativa, a interpretação judicial esvaziou todo o conteú-
do da norma, que uma vez mais torna-se incapaz de limitar o poder puni-
tivo na execução penal.
14 Conforme a pacífica jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, os componentes isolados dos aparelhos de tele-
fonia celular são abrangidos pelo tipo disciplinar, como o chip, por exemplo. Nesse sentido, cf. STF, j. 08 out. 2013, RHC
117.985 - DF, Rel. Min. Rosa Weber. No Superior Tribunal de Justiça a situação é ainda mais grave, pois há precedentes
de que até mesmo partes não constitutivas dos aparelhos estariam abrangidas na norma disciplinar, como o carregador
do aparelho. Nesse sentido, cf. STJ, j. 07 nov. 2013, HC 278.584 – SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura.