

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 185 - 205, jan - fev. 2015
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De igual sorte, doutrinas jurídico-penais, como o Direito Penal do
Inimigo, Direito Penal de Emergência, Tolerância Zero e Movimento de Lei
e Ordem, que embasam a repressão arbitrária a cidadãos que exercem
seu constitucional direito à livre manifestação de pensamento, não condi-
zem com os preceitos basilares do Estado Democrático de Direito.
Como bem destaca Roxin, o Direito Penal deve servir apenas à tute-
la de bens jurídicos imprescindíveis à vida coletiva em harmonia. De ma-
neira que não cabe ao Direito Penal tutelar convicções morais, religiosas
ou políticas
39
.
Cumpre salientar, como afirma o eminente professor Nilo Batista,
que “seletividade, repressividade e estigmatização são algumas caracte-
rísticas centrais dos Sistemas Penais”
40
. Desse modo, pelo fato de o siste-
ma penal trazer tantas máculas à dignidade humana, o Direito Penal, en-
quanto elemento que compõe o sistema penal deve ser um instrumento
do Estado Democrático de Direito.
Nas palavras de Ferrajoli, o Direito Penal só é válido enquanto “ins-
trumento de defesa e de garantia de todos: da maioria ‘não desviada’, mas
também da minoria ‘desviada’, que, portanto, se configura como um Direito
Penal Mínimo, como técnica de minimização da violência na sociedade”
41
.
Somente a partir de um Direito Penal inserido no paradigma do Es-
tado Democrático de Direito é que se pode frear o Estado Policial. De modo
que se coadune com os valores de respeito inexoráveis ao ser humano, que
priorizem a dignidade humana. Apenas um Direito Penal ancorado sob a
base principiológica e constitucional pode conter as arbitrariedades do pró-
prio poder punitivo e propiciar a construção de um modelo de sociedade
mais tolerante e harmônica, apto a erigir ideais de justiça e igualdade.
É necessário estar atento às violações ao ser humano, às afrontas
cotidianas, sobretudo em tempos hodiernos, quando em nome da ordem
e da segurança pública, direitos fundamentais como a dignidade humana
têm sido cotidianamente açambarcados. Nesse sentido, o grande desafio
posto para a democracia, é a contenção da barbárie perpetrada pelos
modelos opressores, que se traduzem nos Estados de Polícia.
39 ROXIN, Claus.
A proteção de bens jurídicos como função do Direito Penal.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009.
40 BATISTA, Nilo.
Introdução crítica ao direito penal brasileiro
. 4ª ed. Rio de Janeiro: Revan, 1999, p. 26.
41 FERRAJOLI, Luigi. "A pena em uma sociedade democrática". Trad.: Christiano Fragoso. Instituto Carioca de Crimi-
nologia
. In.
:
Revista Discursos Sediciosos
: crime, direito e sociedade. V.: 12. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2002, p. 32.