

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 142 - 163, jan - fev. 2015
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ou não da hipótese acusatória, sendo-lhe vedado, ademais,
redefinir
a
acusação, porque as disposições contidas no art. 384 do CPP, por violarem
a separação entre os órgãos de acusação e julgamento, não são demo-
cráticas: “
Daí o valor da separação, segundo o esquema triangular, entre
acusação, defesa e juiz: se a acusação tem o ônus de descobrir hipóteses
e provas e a defesa tem o direito de contraditar com contra-hipóteses de
contraprovas, o juiz, cujos hábitos profissionais são a imparcialidade e a
dúvida, tem a tarefa de ensaiar todas as hipóteses, aceitando a acusatória
só se estiver provada e não a aceitando, conforme o critério pragmático
do favor rei, não só se resultar desmentida, mas também se não forem
desmentidas todas as hipóteses em conflito com ela
.”
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Este será, portanto, o momento da ‘inferência dedutiva’, segunda
etapa da epistemologia garantista. A partir da conduta comprovada
indu-
tiva
e
democraticamente
, conforme as regras do jogo, pode-se proceder
à verificação de sua pertinência
dedutiva
, com as
manhas
e
redefinições
próprias, antes delineadas. Por isso é que sem uma discussão séria das
possibilidades e limites
epistemológicos
, em suma, do que se constitui
em ‘verdade’, o jogo processual resta entregue ao (des)enlace
Metafísico
,
abrindo espaço para adoção, mesmo
inconsciente
e em Estados (ditos)
Democráticos de Direito, de práticas
antigarantistas
.
É que apesar de maneira elegante – e, às vezes, cínica –, defender-
se, no discurso
consciente
, o respeito pelas
garantias penais
e
processuais
necessárias à legitimidade da sanção, a existência normativa adversa des-
carrilha a interpretação dos ferrenhos legalistas, dos ‘Trumans’. Sofrem
do que se apontou como sendo ‘Complexo de Prazo de Validade’, uma vez
que: “
O positivista ferrenho vai ao Supermercado e confere – na forma da
lei – os prazos de validade e somente consome o produto até o dia fatí-
dico, ou seja, se o prazo de validade é hoje, somente pode consumir até
às 24:00 horas; às 00.01 o produto está fora do prazo de validade e, por-
tanto, inservível ao consumo. Para este, no exato minuto que se transpôs
o dia, as bactérias, em Assembleia Geral Ordinária – adrede convocada
– decidiram, à unanimidade, avançar (estragar) sobre o produto. O prazo
fatal é 24:00hs. Somente rindo ! E o pior é que essa ingenuidade mesclada
com astúcia é reproduzida pelo senso comum teórico dos juristas.
”49
48 FERRAJOLI, Luigi.
Direito e Razão..
., p. 122.
49 MORAIS DA ROSA, Alexandre.
Amante Virtual...
, p. 73-74.