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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 17, n. 66, p. 158 - 186, set - dez. 2014

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certamente irá ultrapassar aquela quantia inicial de R$ 100.000,00. Assim,

chegamos o valor de

going concern

.

Agora, digamos que o lago é público e que há diversos outros pes-

cadores interessados em vender os peixes. Não há como garantir que, ao

limitar a quantidade de peixes que você pesca e vende, os demais pesca-

dores irão fazer o mesmo. Logo, é preciso alguma regra que impeça todos

os pescadores de atuarem como se fossem os únicos donos do lago.

É assim que funciona a recuperação judicial. Ao instituir um sistema

majoritariamente concursal, objetiva-se maximizar o valor dos ativos e,

assim, maximizar o valor de pagamento aos credores. Ou seja, a manu-

tenção da atividade da empresa – em contraposição à liquidação de seus

ativos – permite que a mesma volte a gerar recursos e pagar devidamen-

te os seus credores. De acordo com Thomas Jackson,

“the most obvious

reason for a collective system of creditor collection is to make sure that

creditors, in pursuing their individual remedies, do not actually decrease

the aggregate value of assets that will be used to repay them.”

65

Diz-se majoritariamente concursal, pois, como visto acima, há hipó-

teses de créditos não submetidos à recuperação judicial, cujos credores

podem exigir o adimplemento de suas dívidas em verdadeira execução

singular. Essa execução tem impacto direto no valor de

going concern

da

empresa em recuperação.

Não se pode negar as vantagens que as travas bancárias acarre-

tam quando da concessão de empréstimos e, assim, fomento à economia.

Contudo, elas podem justamente ter o efeito contrário em hipóteses em

que as tomadoras se encontram em situações econômicas frágeis, porém,

superáveis.

Logo, a aplicação da trava bancária em sede de procedimento de

recuperação judicial deve ocorrer com cautela e somente quando preen-

chidos todos os requisitos legalmente previstos.

A preocupação com o equilíbrio dos interesses é claramente refle-

tida no já mencionado voto do Min. Luis Felipe Salomão, nos autos do

REsp nº 1263500/ES, em que, ao mesmo tempo que reconheceu que “

se

as garantias conferidas aos credores, principalmente instituições finan-

ceiras, forem gradativamente minadas por decisões proferidas pelo Juízo

65 Tradução livre: “A razão mais óbvia por trás de um sistema coletivo de execução é garantir que os credores,

na perseguição de seus créditos individuais, não diminuam o valor agregado dos ativos que serão utilizados para

satisfazer seus créditos.”