

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 17, n. 66, p. 114 - 137, set - dez. 2014
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Mesmo após expor estas verdades inglórias, há uma expectativa de
mudança; indícios na política interna parecem alterar os rumos de nossa
sociedade. A partir do Seminário Internacional de Políticas Públicas So-
bre Drogas (2004), observa-se uma alteração na política sobre o tema,
como, por exemplo, a troca do prefixo “anti” pelo termo “sobre”. As Po-
líticas Nacionais (PNAD), Sistema Nacional de Políticas Públicas (SISNAD),
Secretaria Nacional de Políticas Públicas (SENAD) e Conselho Nacional
de Políticas Públicas (CONAD) deixaram de ser “antidrogas” para serem
“sobre drogas”. Na mesma linha de raciocínio, termos com “entorpecen-
tes” e “tóxicos” deixam de ser utilizados de forma separada das drogas
lícitas, atitude que aventava com desigualdade a abordagem, tratamento
e reconhecimento de pessoas iguais. Hoje, vê-se o emprego de termos
como “álcool, tabaco e outras drogas”, em sentido oposto ao que foi ante-
riormente dito, aproximando substâncias “ilícitas” das “lícitas”. Primeiro
passo, elementar, para uma caminhada com ênfase na política preventiva
e restaurativa, em contraponto à fracassada política repressiva e retribu-
tiva, baseada no castigo. No plano internacional, há países que descrimi-
nalizaram as drogas e vêm observando a queda no consumo, redução dos
efeitos colaterais da guerra, aumento da qualidade das substâncias que
antes eram ilícitas, causando menos afetação à saúde pública.
O professor Henrique Soares Carneiro
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elucida: “Viciados em açú-
car, em aguardente, em tabaco, em café, em chá, em chocolate, em ópio,
assim as populações mundiais expandiram o comércio exterior, alimen-
taram os tributos estatais, foram estimuladas nas fábricas e nas grandes
plantações. O álcool, o tabaco e as drogas da indústria farmacêutica conti-
nuam sendo estimulados licitamente com publicidade e incentivos diver-
sos. Outras substâncias, muitas com danos comparáveis muito inferiores
(como derivados de cânhamo), continuam proibidas, mas são os primei-
ros produtos agrícolas da Califórnia e do Canadá em faturamento. Alguns
países, de governos fundamentalistas, proíbem o álcool. Outros, ditato-
riais, como a China, fuzilammilhares de pessoas a cada ano por acusações
de uso ou comércio de drogas. Como alternativa, devemos lembrar que,
como já acontece, de forma registrada, há mais de dois milênios e meio,
podem-se gerir as formas de uso das drogas, de forma a fazer prevalecer
os valores da tolerância e da temperança, recusando assim a noção coer-
citiva totalitária da abstinência obrigatória para toda a sociedade. Todas
45 CARNEIRO, Henrique Soares. "As drogas e a história da humanidade". Novembro 2009. Artigo disponibilizado no
Curso Prevenção do Uso de Drogas
– UFSC – SENAD – 2013.