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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 4, p. 101 - 124, Setembro/Dezembro. 2017

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Some-se a isso, ainda, o esgarçamento do tecido normativo, com ex-

pressões de conteúdo semântico aberto, dando maior margem de manobra

aos juízes, com decisões mais volúveis e discricionárias.

10

Ou seja, passou-se

a se legislar pela técnica de cláusulas gerais e princípios abstratos, o que, em

última análise, tem ocasionado em uma atuação mais maleável pelo Judiciá-

rio. Tome-se como exemplo a cláusula da “boa-fé objetiva” prevista no artigo

113 do Código Civil, no artigo 4ª, III, do Código de Defesa do Consumidor

e no artigo 5ª do Código de Processo Civil de 2015.

A promulgação da nova Constituição, portanto, aliada a diversos ou-

tros fatores, importou uma enxurrada de ações nos nossos Tribunais, no-

tadamente em nosso Supremo Tribunal Federal

11

. Este passou, portanto, a

ser protagonista de nossa política, decidindo questões de grande relevo nos

últimos anos, como a união de pessoas do mesmo sexo, a possibilidade de

aborto de fetos anencéfalos, a infidelidade partidária, a questão das cotas

raciais em universidades públicas, dentre outros. Fala-se, assim, que vivemos

a era do Judiciário. Chega-se até mesmo a se dizer que viveríamos uma

“Supremocracia”

12

, embora existam os que neguem e ponderem ser esta a era

da judicialização.

13

Sucede que, por mais paradoxal que pareça, nossa Suprema Corte em

um primeiro momento, posterior à promulgação da Constituição de 1988,

buscou criar mecanismos para contenção dessa avalanche de ações que pas-

saram a bater a sua porta. Como diz Diego Werneck:

“no período imediatamente após a promulgação da Constitui-

ção é possível ver em ação mecanismos judiciais interpretativos

do tipo restritivo. Pode-se observar Ministros do Supremo fir-

10 MAUS, Ingeborg.

O Judiciário como Superego da Sociedade: a jurisdição na sociedade órfã de Pai

. Coleção Conexões

Jurídicas. Tradução de Geraldo de Carvalho e Gercélia Batista de Oliveira Mendes. Rio de Janeiro. Lumenjuris, 2010. p. 20.

11 Como mostra Marco Paulo Veríssimo “em um ano antes de ser promulgada a atual Carta Constitucional, em 1987,

computavam-se nas estatísticas de julgamento do órgão 20.122 casos resolvidos em doze meses. Vinte anos depois, ou

seja, em 2007, essas mesmas estatísticas registravam 159.522 casos para o mesmo período de tempo.” (VERÍSSIMO, Mar-

co Paulo.

A Constituição de 1988 vinte anos depois: Suprema Conte e Ativismo Judicial “à brasileira”

, Revista GV,

São Paulo, 2008, disponível em

http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/114.pdf

acessado em 04/05/2017)

12 VIEIRA, Oscar Vilhena.

Supremocracia

. Revista Direito GV. Volume 4. São Paulo. 2008.

13 Thamy Pogrebinschi sustenta que o Supremo brasileiro não seria ativista. Através de pesquisa empírica a autora traz

sete argumentos para chegar a essa conclusão: (1)o STF declara nula apenas 0,02% das leis editadas pelo Congresso; (2)o

STF nega a maioria esmagadora das ação de inconstitucionalidade manejadas; (3)a maioria das vezes que o STF declarou

uma norma constitucional já havia outra norma tratando do tema; (4) Na maioria das vezes que o STF declara uma norma

nula, o Congresso edita outra sobre o mesmo tema em seguida; (5)o STF acaba incentivando o Congresso a agir mais

rápido; (6) O STF nas últimas decisões não seria nem governista nem oposicionista, mas sim equilibrado em números; e

(7)o STF preserva as leis pela interpretação conforme a constituição, pela insconstitucionalidade sem redução do texto e

pela modulação dos efeitos. ( POGREBINSCHI, Thamy.

Judicialização ou representação? Política, Direito e Demo-

cracia no Brasil.

Rio de Janeiro. Elsievier, 2011. p 11-13)