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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 1, p. 164 - 195, Janeiro/Abril 2018

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ou da utilidade em concreto da prestação jurisdicional pretendida. A fim

de clarear se o demandante precisa efetivamente da prestação jurisdicional

para evitar-lhe dano injusto, e se dita prestação lhe será útil na busca desse

objetivo, faz-se imprescindível o exame da relação jurídica preexistente ao

processo, que por ele deverá ser dirimida. Esse escrutínio poderá, de resto,

envolver a necessidade de se esquadrinhar variados aspectos do vínculo de

Direito Material que o autor afirma existir, sem o que não se chegará a con-

cluir sobre a necessidade e a utilidade do provimento almejado.

63

Mas, da

leitura dessas lições, fica sempre uma percepção de diversidade, quando não

de insegurança ou estranheza, quanto à identificação do mérito também no

relativo ao interesse.

64

Há exemplo excelente, colhido na mais acreditada doutrina. Se um

demandado por dívida de valor monetário alega ter o autor e suposto cre-

dor, em seu poder, quantia em dinheiro pertencente ao réu, com a qual

poderia resolver o seu crédito mediante compensação, carecendo, pois, de

interesse de agir, a investigação desse requisito envolverá uma vasta gama

de questões, algumas de fundo, sem cuja resolução não se poderá apurar a

presença ou ausência do interesse de agir.

65

À parte outras questões de fato

e de direito, será preciso averiguar se o contrato entre as partes autoriza

semelhante operação; se o valor é suficiente; se a cláusula de compensação

é válida em face da proibição geral de autotutela e assim por diante. Todas

essas perguntas pertencem ao Direito Material e ligam-se ineludivelmente ao

mérito. E todas – e cada uma delas – devem ser dirimidas para que se possa

apurar se o requisito do interesse está ou não presente.

Em tempos recentes, têm afluído aos pretórios, em quantidade im-

pressionante, ações de prestação de contas movidas por correntistas a ins-

tituições bancárias, no fito de obter elucidação das operações relativas à

respectiva conta. Os bancos defendem-se com a alegação de haverem, pe-

riodicamente, fornecido ou posto à disposição dos autores os extratos e

demonstrativos de movimentação das contas, de tal sorte que os correntistas,

assim informados da evolução das parcelas de débito e crédito, não neces-

63 Cf., por exemplo,

F

ábio

L

uiz

G

omes

,

Carência de ação

p. 73, São Paulo, 1999. O desserviço que essa locução fluida e

imprecisa prestou à jurisprudência nacional foi destacado em termos ainda mais candentes no texto original do autor, tese

acadêmica da qual fui examinador (em reprografia).

64 Meu próprio convencimento quanto ao tema, manifestado no já citado artigo “Extinção...” e alhures, tem sido o de

que

pelo menos

a possibilidade jurídica e a legitimação à causa pertencem ao mérito. Como outros autores que, com maior

autoridade, versaram o tema, nunca tive a mesma segurança quanto ao requisito do interesse.

65 O exemplo é de

P

ontes de

M

iranda

,

Comentários ao Código de Processo Civil

(de 1973), t. I, p. 125, 4ª ed., Rio, 1995, com

atualização de Sergio Bermudes.