

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 72, p. 203 - 219, jan. - mar. 2016
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qualificadoras subjetivas que, eventualmente, tenham sido apresentadas
pela acusação.
3º arrazoado: Solução para os casos anteriores à Lei 13.104/2015
Nos crimes anteriores a 10 de março de 2015 o motivo torpe (ou
fútil, conforme posição) continuará incidindo nos homicídios em que uma
das três situações que configuram o feminicídio no Brasil esteja presente
(violência doméstica e familiar nos termos da Lei Maria da Penha, menos-
prezo ou descriminação à condição de mulher).
Tal solução reforça a tese de que a qualificadora do feminicídio é
de ordem subjetiva, pois, antes de termos um aclaramento do tema pela
Lei 11.304/2015, as três situações que hoje configuram o feminicídio no
Brasil eram, quando trazidas ao processo criminal, enquadradas em quali-
ficadoras de natureza subjetiva (motivo torpe ou motivo fútil).
Como se disse anteriormente, a Lei do feminicídio não trouxe uma
nova qualificadora, tratando, apenas, de aclarar situação já de ordinário
presente nos processos penais que envolvemmorte de mulheres, mas que,
frequentemente, não vinha à tona. A invisibilidade da violência contra a
mulher, aliás, não é fenômeno unicamente vivenciado no campo jurídico,
mas que, infelizmente, abarca todas as esferas da vida das mulheres.
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A técnica de tipos penais neutros que até então predominava em
nossa legislação no que tange ao homicídio foi substituída pela crimina-
lização gênero-específica. Constatou-se que não são suficientes os tipos
penais neutros, pois o fenômeno da violência contra a mulher permanece
oculto onde subsistem pautas culturais patriarcais, machistas ou religio-
sas muito enraizadas e que favorecem a impunidade, deixando as víti-
mas em situação de desproteção. Ou seja, corria-se (e ainda se corre, por
restos de cultura machista que ainda circulam, inclusive, evidentemente,
entre juízes) o risco de a sentença ser alcançada por tais concepções de
mundo, o que reforçava a invisibilidade do fenômeno e impedia que se
fizesse justiça ao caso concreto, já que a maior carga de desvalor do fato
(feminicídio) não estava sendo levada em consideração. E não se propõe
punir mais, mas em fazê-lo de acordo com a gravidade do fato.
11 Exemplificativamente, pesquisa “Violência contra a mulher no ambiente universitário” elaborada pelo Instituto
Avon em parceria com o Data Popular aponta que para 27% dos universitários, abusar de garota bêbada não é
violência. Outro dado trazido na Pesquisa: medo já fez 36% das mulheres deixaram de fazer atividades acadêmicas.
Disponível em:
http://g1.globo.com/educacao/noticia/2015/12/para-27-dos-universitarios-abusar-de-garota-beba-da-nao-e-violencia.html. Acesso em 03.12.2015.