

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 88 - 104, jan - fev. 2015
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irracional da liberdade não tende a seus limites, mas ao infinito de sua
arbitrariedade”
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? Apenas um acontecimento
totalmente externo
pode,
assim, preservar a liberdade de sua autodestruição. Pois a verdade do Ou-
tro é determinada pela Ética, é uma
verdade ética
- um questionamento
ético ao Mesmo. A questão ética demanda uma resposta ética. Esta res-
posta ética principia com a recusa do jogo totalizante: a liberdade não
pode ser mais absolutamente livre, sem que com isso abdique de seu
status próprio como liberdade autopostulante e se precipite no limbo de
sua própria autodestruição. Liberdade significa agora
iniciar onde inicia a
liberdade do Outro
, ouvir e responder ao questionamento ético absoluto,
estar investida de responsabilidade. Eu sou livre para dar minha resposta
ética - minha resposta justa - ao questionamento extremo do outro. A jus-
tiça assimétrica sustenta a partir de agora a precariedade e a não legiti-
midade de minha liberdade, sem que com isso eu tenha de renunciar ao
absoluto: eu sou
absolutamente livre
para ser e me tornar justo à medida
da
exigência absoluta
do Outro, para colocar meu Eu à disposição do Outro
- o que significa,
para constituir um Eu propriamente dito, o Eu que é res-
ponsabilidade pelo Não-eu para além da simples afirmação fichteana
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- na
responsabilidade inteira que escapa à minha tautologia. O sentido de minha
liberdade não habita nela, mas na
fuga
de sua limitação e totalização. Mais
um paradoxo: para ser livre, a liberdade tem de se
libertar
de sua tendência
totalizante a uma absoluta autojustificação. Pois eu sou absolutamente livre
para não permanecer encerrado em minha Totalidade.
Referências bibliográficas
BOURETZ, P.
Testemunhas do futuro – filosofia e messianismo
, São
Paulo: Perspectiva, 2012.
CIARAMELLI, F.
Transcendance et Ethique - Essai sur Levinas,
Bru-
xelles, 1989.
LEVINAS, E.
De l’Evasion
, Montpellier: Fata Morgana, 1982.
_______,”Totalité et totalisation”
in:
Encyclopédie Universelle
, Pa-
ris, 1973, v. 16.
23 LEVINAS, E.
Totalité et Infini
, p. 280.
24 A constituição desse Sujeito ético para além dos esquemas tradicionais todos eles mais ou menos credores de uma
racionalização lógica que remonta em última análise a Descartes e Fichte - ainda quando negam esta lógica, pelo fato
mesmo de o negarem logicamente - é o tema da obra maior de Levinas,
Autrement qu’être ou au-delà de l’essence.