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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 570- 586, jan - fev. 2015

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No livro

Holocausto Brasileiro

, lançado em 2013 pela também jor-

nalista Daniela Arbex, é revelada uma história até então desconhecida pela

maior parte dos brasileiros. Pelo menos 60 mil pessoas morreram entre os

muros do maior hospício do Brasil, a Colônia de Barbacena, localizada na

cidade de mesmo nome, em Minas Gerais. A maioria dos internos havia

sido internada à força. Cerca de 70% não tinham diagnóstico de doen-

ça mental. Eram epiléticos, alcoólatras, homossexuais, prostitutas, gente

que se rebelava ou que se tornara incômoda para alguém commais poder.

Eram meninas grávidas violentadas por seus patrões, esposas confinadas

para que o marido pudesse morar com a amante, filhas de fazendeiros

que perderam a virgindade antes do casamento, homens e mulheres que

haviam extraviado seus documentos. Alguns eram apenas tímidos. Pelo

menos 33 eram crianças. Pelo menos 30 bebês foram roubados de suas

mães. As pacientes conseguiam proteger sua gravidez passando fezes so-

bre a barriga para não serem tocadas. Mas, logo depois do parto, os bebês

eram tirados de seus braços e doados.

“Umas poucas vezes os esqueletos subiam a superfície. Pas-

sada a comoção pública, voltavam ao fundo empurrados

pelas pedras de sempre. Em 1961, a rotina do Hospício foi

contada na Revista

O Cruzeiro

pelo fotógrafo Luiz Alfredo e

pelo repórter José Franco. O título da matéria era “A sucursal

do inferno”. Em 1979, o repórter Hiram Firmino e a fotógrafa

Jane Faria publicaram a reportagem “Os porões da Loucura”,

no

Estado de Minas

. O documentário “Em nome da razão”,

de Helvécio Ratton, filmado em 1979, tornou-se um símbolo

da luta antimanicomial. (...) Apesar da denúncia estampada

na revista de maior sucesso da época, a realidade só começa-

ria a mudar – lentamente – duas décadas mais tarde, a partir

dos anos 80, quando a reforma psiquiátrica ganhou força”.

16

Alguns morriam de frio, fome e doença. Morriam também de cho-

que. Às vezes, os eletrochoques eram tantos e tão fortes, que a sobre-

carga derrubava a rede do município. Nos períodos de maior lotação, 16

pessoas morriam a cada dia. Ao morrer, davam lucro. Entre 1969 e 1980,

1.853 corpos de pacientes do manicômio foram vendidos para 17 faculda-

des de medicina do país, sem que ninguém questionasse. Quando houve

16 Autor: Arbex, Daniela; Editora: Geração Editorial Holocausto Brasileiro -

Vida, Genocídio e 60 Mil Mortes no

Maior Hospício do Brasil.