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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 570 - 586, jan - fev. 2015

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Quase um século de inércia

É difícil que a purificação do espaço urbano logre êxito sem a co-

laboração da mídia, sociedade e classe política. Ora por omissão, ora por

deturpação de fatos e corroboração política, é possível perceber que a

política pública de higienismo dos indesejados sociais continua a mesma,

permanecendo detidos nos fatos apresentados, desde 1933.

O manifestamente ilegítimo “recolhimento” e internação for-

çada de crianças e adolescentes em situação de rua no Rio de

Janeiro, sob o pretexto de supostamente “livrá-las” do crack, é

mais uma expressiva demonstração de quem são os “inimigos”

na versão brasileira da “guerra às drogas” A mídia e políticos

dos mais variados matizes têm estimulado o pânico do cra-

ck – cópia perfeita da histeria sobre a mesma substância que

dominou a cena nos EUA de 1986 a 1992.17 A consequência

foi a introdução na legislação norte-americana de penas mais

rigorosas para crimes relacionados ao crack, que se constituiu

em fator significativo para o aumento da disparidade racial no

encarceramento massivo registrado naquele país.

21

A história se mostra cíclica. Lançado no fim de 2011, o programa

‘Crack: é possível vencer’, do governo federal, tinha orçamento inicial de

dois bilhões de reais.  “Coincidentemente”, poucos meses antes, estudo

divulgado pela Confederação Nacional de Municípios (CNM), realizado em

meados de 2010, revelou que 92% dos municípios brasileiros não tinham

programas de combate ao uso de crack e que apenas 3,39% deles tinham

convênio firmado com o governo federal para desenvolvimento e financia-

mento de ações de enfrentamento ao uso de drogas.  Em um mesmo mo-

mento em que não há informações qualificadas sobre o tema, o cenário

político se mostra oportuno para municípios acessarem a verba da União.

A outra face nefasta do controle social é o enfrentamento dos po-

bres pelos pobres, reiterando o medo e justificando a estratégia de atu-

ação focada em territórios populares. De acordo com o Instituto de Se-

21 "Direitos Humanos, laço social e drogas: por uma política solidária com o sofrimento humano" - Maria Lucia

Karam. Acesso em 11.01.2014, 23: 27.

http://www.leapbrasil.com.br/media/uploads/texto/36_Direitos%20Huma-

nos%20e%20drogas%20-%20CFP-BSB.pdf?1322168068.