

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 17, n. 66, p. 287 - 308, set - dez. 2014
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rência de uma crise que aflige o Estado, o direito e a dogmática jurídica
- com seus inevitáveis reflexos na sociedade, no arranjo institucional e no
papel desempenhado pela jurisdição constitucional -, um problema que
diz respeito à interpretação concreta do direito - no nível de aplicação -,
ou seja, a hermenêutica jurídica. Nos itens seguintes, um breve retorno a
algumas questões consideradas importantes para a melhor compreensão
dos temas enfrentados: as relações entre a política e o direito e a sepa-
ração de poderes - sua sistematização, evolução e os novos contornos do
constitucionalismo contemporâneo. Finalmente, serão analisados os es-
tudos de Streck sobre as interfaces entre jurisdição constitucional e her-
menêutica, seus argumentos em defesa de sua teoria e algumas das prin-
cipais críticas formuladas pelo autor às teorias da argumentação, a partir
dos seguintes eixos de análise: i) o constitucionalismo contemporâneo e a
teoria da decisão judicial baseada no paradigma hermenêutico-filosófico;
ii) a construção das respostas constitucionalmente adequadas, o enfren-
tamento do sujeito solipsista e a superação da filosofia da consciência; iii)
a necessidade de que a expansão do poder judicial ocorra sem violação
do sistema político.
1. Apresentação do problema: interpretação e aplicação
da Constituição no Brasil e a construção de respostas
aos grandes dilemas oriundos do constitucionalismo
contemporâneo
O século XX foi palco de significativas alterações no ambiente insti-
tucional de alguns países, especialmente pela transferência do poder de
instituições representativas para sistemas judiciários, com a difusão do
conceito de supremacia constitucional como pilar na transição de regimes
autoritários para a democracia
1
. Da mesma forma, o desenvolvimento do
Estado constitucional de direito acarretou também transformações aos
sistemas jurídicos, a partir das noções dirigentes, normativas e compro-
missárias assumidas por alguns textos constitucionais, os quais possuem
determinações de agir e normas com eficácia
2
, contribuindo para “um
1 HIRSCHL, Ran.
"The New Constitucionalism and the Judicialization of Pure Politics Worldwide".
Fordham Law Review
,
v. 75, n. 2, p. 721-754, 2006. Disponível em:
<http://www.ssrn.com/abstract=951610.
Acesso em 25 de junho de 2012.
2 STRECK, Lenio Luiz.
Jurisdição Constitucional e Hermenêutica: uma nova crítica do direito
. 2ª ed. 2ª tiragem. Rio
de Janeiro: Forense, 2004, p. 103.