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ARTIGOS

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Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 23, p. 47-100, 2º sem. 2015

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A concepção dominante do valor do lar e da família, em geral, reme-

te a uma concepção de repetição de estereótipos de “privacidade” e de

“harmonia familiar”, mesmo onde há conflitos extremos com gravíssimos

efeitos na integridade corporal, psicológica e na saúde das mulheres. Tal

concepção foi ferrenhamente combatida na década de 70:

"A concentração da atuação feminista na esfera da segurança

pública iniciada na década de 1980 deveu-se à constatação de

que as mortes de mulheres ficavam impunes. Nesse período, o

feminismo denunciou a absolvição dos chamados “crimes da

honra”, (legítima defesa da honra masculina) ou “crimes da

paixão” e a visão privatista/familista do direito que se recusava

a punir os homicidas de mulheres e a violência doméstica. A

ação feminista focalizava no sistema de justiça e segurança e

objetivava romper com a lógica da impunidade. A forte atua-

ção das feministas durante quase duas décadas foi responsável

pela revogação da tese da legítima defesa da honra masculina

e pelo fortalecimento das pesquisas na área de violência. Com

isso, consolidou-se um campo de atuação política e acadêmica,

com resultados significativos para as mulheres".

11

Esse é um ponto crucial para uma melhor compreensão da vitimiza-

ção secundária gerada pelo judiciário. Alguns juízes das varas e juizados de

violência doméstica e familiar contra a mulher por vezes não conseguem

destacar a sensível e pontual situação vivida pela mulher vítima de violên-

cia – nem a mudança de paradigma pretendida pela Lei Maria da Penha e

toda a lógica dos Direitos Humanos das Mulheres -, e acabam por aplicar a

esses casos os mesmos fundamentos de família como base da sociedade,

com total amparo do Estado

12

, bem como de manutenção desta entidade:

"Fíjense que en España con este sistema la jurisprudencia se

ha decantado por entender que el bien jurídico protegido en

los delitos de violencia doméstica es la paz familiar. Es decir,

se piensa en la familia como institución como objeto de tutela

11 CAMPOS, Idem, ibidem, p. 25.

12 “Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado” – CRFB/88.