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Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro



21 anos de vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente

Responsáveis por fazer cumprir os direitos das crianças e dos adolescentes, o desembargador Guaraci de Campos Vianna e a juíza Ivone Ferreira Caetano, do TJRJ, falam sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, que completou 21 anos no último dia 13.

Para o desembargador Guaraci, a Lei atingiu a sua maturidade, mas não está com seu desenvolvimento completo, porque muitas políticas públicas introduzidas há 21 anos não foram implementadas pela sociedade e pelo Poder Público. Segundo o desembargador, há questões sem avanços, tais como: a institucionalização dos jovens, infratores ou não, o que, infelizmente, não produz uma mudança na realidade cotidiana dos mesmos; a existência de poucas Varas de Infância e Juventude em relação à população dos estados; e a ausência de Câmaras especializadas para julgamento dos recursos em 2ª instância. O desembargador ainda ressalta que “o Poder Executivo investe muito pouco nessa área e vive cortando os parcos recursos que lhe são destinados, e, portanto, as dificuldades decorrentes do não investimento se refletem na crítica que se faz à Lei, que, boa em sua essência, seria melhor ainda se cumprida em sua integridade”.

Entre os avanços ocorridos nesses 21 anos, o desembargador destaca a participação de outros órgãos públicos na implementação da Lei, como o próprio TJRJ, que cria vários projetos socioeducativos, dentre eles o Projeto Justiça pelos Jovens. Ele cita, ainda, a participação do terceiro setor na capacitação e profissionalização dos jovens, como os cursos promovidos pelo SENAC, SESC e outros. A integração operacional entre vários interlocutores da rede de atendimento também merece ser destacada como avanço, embora ainda haja alguns ajustes a se fazer nas relações institucionais entre os conselhos tutelares, o DEGASE e o Judiciário. Os cadastros nacionais de infratores e não infratores, apesar de ainda incompletos, também merecem destaque, pois dentro em breve facilitarão, e muito, o Judiciário e a sociedade como um todo. E finaliza: “Poderíamos avançar mais se toda a retaguarda construída pelo Poder Público e pela sociedade em geral tivesse a ativa participação do juiz da Infância, que é, no fundo, aquele que está na linha de frente da solução dos problemas”.

Já a juíza Ivone Caetano destaca que o Estatuto da Criança e do Adolescente, na verdade, é uma das leis mais progressistas e seus princípios são baseados nas convenções internacionais e na Constituição da República. Segundo a juíza, é uma Lei na qual todos os direitos das crianças e dos adolescentes são pontuados, o que representa uma forma de resguardá-los. E os responsáveis pelo resguardo desse direito são a família, a comunidade, a sociedade e o poder público.

Entretanto, para a juíza Ivone, “após 21 anos, quando a Lei adquire a maioridade na prática, poucos avanços foram obtidos, porque para atender as normas do Estatuto, necessária se torna a implementação de todas as políticas públicas ali previstas.

E, para a implementação de tais medidas, faltam vontade política, consciência e fiscalização, principalmente da sociedade. Mesmo com o advento do Estatuto, a sociedade se manteve omissa em relação à situação das crianças e dos adolescentes. E isso pode ser percebido em relação à criança e ao adolescente em situação de rua, hipótese em que a sociedade observava, em omissão contemplativa, o flagelo que se abatia sobre as crianças, e sua única atitude era dar esmolas, o que, supostamente, aplacaria a sua culpa pela omissão. Na verdade, tal atitude reforçava a permanência das crianças na rua. Neste momento em que vivenciamos verdadeira catástrofe que atinge nossas crianças e adolescentes, fenômeno causado pelo uso das drogas, inclusive o crack, nossa sociedade parece despertar”.

A intervenção da Secretaria Municipal de Assistência Social, em ação prevista no protocolo de abordagem, editada no sentido de acolher e proporcionar tratamento antidrogadição compulsória àqueles que se constatarem dependentes é uma atitude pioneira. E no entender da Dra. Ivone, “é uma iniciativa eficaz, o que contraria alguns segmentos de psicólogos, assistentes sociais e alguns profissionais da saúde.

A sociedade vem aprovando quase que por unanimidade tal iniciativa, isso porque começa a despertar para essa grave e caótica situação. Não posso entender e questionar o discurso retrógrado daqueles que acenam com a violação do direito de ir e vir da criança e do adolescente para se contrapor a essa iniciativa, que, na verdade, já se fez tardiamente, pois com ela se atende a todas as regras vigentes no país, posto que está dentro dos princípios estabelecidos pelas convenções internacionais da Constituição e dos estatutos e é baseada na doutrina de proteção integral e no princípio do melhor interesse da criança e do adolescente. Quando a família falha ou está desintegrada, cabe ao poder público agir, e essa iniciativa traz embutido em seu bojo o cuidado como valor jurídico em toda a sua dimensão. Devo pontuar, mais uma vez, que nenhum direito é ilimitado se estiver ferindo o principal direito fundamental, ou seja, a vida.


E para finalizar, a juíza titular da Vara da Infância, da Juventude e do Idoso da Comarca da Capital/RJ e presidente do Fórum Permanente da Criança e do Adolescente da EMERJ deixa sua mensagem: “Não se deixem abater. Tudo é possível. Por menor que seja a pedrinha, o brilho será grande quando se tiver força, se tiver fé em Deus e, principalmente, autoestima”.

A juíza apresentará no próximo dia 18, na Universidade de Saúde Mental, em Berlim, Alemanha, a palestra: “Direitos Sociais dos Meninos de Rua do Rio de Janeiro”.