

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 1, p. 196 - 208, Janeiro/Abril. 2018
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gem precisa e elegância literária da mais alta qualidade, de tratar com pro-
fundidade de temas dogmáticos, era um pensador do processo e do direito.
Admirado e querido por todos, reverenciado no Brasil e no exterior,
deixou uma lacuna que jamais será preenchida.
Com orgulho, participo desta homenagem que lhe está sendo
prestada, com um texto não dogmático, que versa sobre preocupação
que também foi sua.
2) O aparente paradoxo
Quanto mais flexíveis são os parâmetros que orientam as decisões
do juiz, maior é a relevância de que se respeitem as decisões dos Tribunais
Superiores.
Já observei, em vários textos escritos anteriormente
1
, que hoje as leis,
em geral, estão repletas de conceitos vagos ou indeterminados, de cláusulas
gerais, e a importância que se dá aos princípios jurídicos vem se acentuando
visivelmente nas últimas décadas.
Portanto, a lei, pura e simplesmente, muitas vezes não garante mais
automaticamente tratamento isonômico aos jurisdicionados, porque passa
necessariamente pelo “filtro” dos Tribunais para que estes, à luz da doutrina
e de outros elementos, decidam casos concretos, por meio de processos inter-
pretativos cada vez mais complexos e que têm, de fato, o potencial de levar
a decisões diferentes e desarmônicas entre si.
Hoje se considera que o Direito não é um sistema impecável e irrepre-
ensivelmente lógico. Fala-se muito mais em
racionalidade
do que em
lógica
.
Parece ser sintomática, a esse propósito, a circunstância de cada vez
mais incluírem-se parâmetros de decisões ditos
fuzzy
ou “nublados” nos
textos de direito posto, como uma forma de tentar absorver a complexidade
do mundo real. São os conceitos vagos e as cláusulas gerais de que falamos
antes. Assim como é sintomática a necessidade que vem sendo sentida na
comunidade jurídica, de que os princípios jurídicos integrem, de forma cada
vez mais significativa, os raciocínios de direito.
Há tempos venho sustentando estes parâmetros mais nublados ou,
usando uma linguagem mais próxima ao dia a dia do operador do direito,
conceitos indeterminados, cláusulas gerais e princípios jurídicos são
poros
que permitem à
realidade penetrar
no
direito
.
1 Uma reflexão sobre as “cláusulas gerais” no Código Civil de 2002 – a função social do contrato.
Revista dos Tribunais,
vol.
831, p. 59, jan./2005, também publicado na coletânea
Doutrinas Essenciais Obrigações e Contratos,
vol. 3, p. 949, jun./2011.