Revista Magistratus - Número 6 - Dezembro 2018 - Edição Comemorativa
18 19 Revista Magistratus 2018 2018 Revista Magistratus O PERFIL DO PSICOPATA E A VISÃO COMPORTAMENTAL DO CORRUPTO CONTUMAZ INSTITUCIONAL As estatísticas revelam que 4% da população mundial é composta de pessoas consideradas psicopatas - indivíduos com alto grau de indiferença pelo outro e com incapacidade de se importar ou amar. Esta seria a melhor definição de um psicopata, segundo a médica psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, autora do livro “Mentes Perigosas: o psicopata mora ao lado”. A escritora esteve na Escola da Magistratura do Rio para participar do evento “Corrupção e seus Desdobramentos Sociojurídicos” e falou sobre a visão comportamental do corrupto contumaz, relacionando o tema com a psicopatia. “O s psicopatas são pessoas que teriam quase 100% de razão e quase zero de emoção. Significa que são extremamente inteligentes quando a avaliação é cogniti- va e não emocional”, explicou a psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, ao distinguir que, por mais que grande parte das pesso- as acreditem ser o psicopata um doente, ele é absolutamente saudável, no que se refere à saúde mental. Segundo Ana Beatriz, o conceito de psicopatia consta de forma equivocada no Código Penal, pois é definido como uma doença mental, e não é. “A psico- patia é um transtorno de personalidade, do jeito de agir. O psicopata tem valores internos distorcidos diante de uma socie- dade. Então eu diria que o psicopata não possui uma consciência subjetiva, ou seja, a sensação de se importar com o outro, de se sensibilizar”, explicou a psiquiatra. Ana Beatriz relevou que muitos estudos indicam que todo indivíduo nasce com senso de responsabilidade - é genuíno -, pois existe uma fração de sen- timento que faz com que o indivíduo se importe com o outro, e isso é detectado a partir de 8 meses de idade. “Os psi- copatas, se observados desde a infância, são crianças que já detêm uma indiferen- ça com o sofrimento de outras crianças ou se divertem com o sofrimento de ani- mais, por exemplo”, disse Ana Beatriz. A escritora compara a mente do psicopata com música: “O psicopata não tem emoção, porém finge muito bem ter. Eles sabem a letra da música, mas não sentem a melodia. Eles escutam muito bem as pessoas, sabem o que dizer e a hora certa de dizer”. Três objetivos principais norteiam a vida de um psicopata, segundo Ana Beatriz. São eles: poder, status e diver- são. “O psicopata sempre estará bus- cando esses objetivos de uma forma violenta, com sensação de impunidade, o que o fará repetir aquilo, também pela sensação de prazer”. A psiquiatra expli- cou que isso ocorre porque a parte do sistema límbico do cérebro, relaciona- da a emoções e comportamentos, não funciona em pessoas com psicopatia. “As memórias que tiveram maior com- ponente afetivo e emocional se mantêm nos indivíduos normais. No caso dos psicopatas, o que acontece é que essas pessoas, por não terem o sistema límbico do cérebro operante, não detectam que fizeram algo errado e repetem os atos”. Ana Beatriz contou que o psicopata con- sidera normal tirar vantagens das situa- ções, passar pessoas para trás, achar gra- ça de golpes ou sentir prazer com a dor do outro, e ainda tende a culpar a vítima pelo seu ato. A médica psiquiatra considera que, dentro do sistema penitenciário, os psi- copatas interferem significativamente nas chances de recuperação daqueles deten- tos que não têm o transtorno. “Dentro do sistema penitenciário, 15% são psico- patas, os outros 85% não são, ou seja, te- riam mais probabilidade de recuperação”, esclareceu, considerando que deveria ha- ver o que denominou de uma separação do joio do trigo para que o sistema peni- tenciário fosse eficaz. Após traçar uma visão geral sobre os psicopatas, Ana Beatriz Barbosa Silva iniciou sua análise sobre os corruptos e a psicopatia. Ela comparou o corrupto contumaz a um pedófilo, e disse: “Se formos raciocinar dentro disso, o cor- autor do termo “ponerologia”. Ele estu- dou durante três décadas como os psico- patas influenciam no avanço da injustiça e como abrem caminho para o poder na política. O autor destaca a dimensão Três objetivos principais norteiam a vida de um psicopata : poder, status e diversão macrossocial da psicopatia, ao demons- trar como um grupo de políticos psico- patas é capaz de corromper a sociedade. “Ao estudar políticos e funcioná- rios ligados ao poder e à vida pública, o psiquiatra polonês detectou que so- mente psicopatas no exercício do poder seriam responsáveis por algumas atroci- dades como genocídios e outras barba- ridades submetidas a um povo, como o que foi feito por Hitler, Stalin e Pol Pot”, mencionou Ana Beatriz. Segundo o es- tudioso Andrew Lobaczewski, os psico- patas no poder são capazes de reunir os seguintes aspectos: ausência de senso de culpa por suas ações antissociais, in- capacidade de amar verdadeiramente e a tendência à eloquência como prática de desvio e manipulação das questões importantes para a sociedade. “De fato, essas pessoas não se importam se não há, por exemplo, vagas para doentes fa- zerem hemodiálise nos hospitais; não se importam de desviar verba da saúde pú- blica, e vão usar um discurso lindo para justificar isso”, considerou a psiquiatra. Destacam-se como característi- cas do psicopata na política e no trato da coisa pública, segundo Ana Beatriz, a superficialidade, a eloquência, o ego- centrismo, a megalomania, a ausência de empatia, a exclusão da culpa, a utilização recorrente de mentiras e trapaças, a ma- nipulação e a falta de responsabilidade. “Eu costumo dizer que verdade para es- sas pessoas é um substantivo abstrato”, declarou. Ao final de sua palestra, a médica fez o questionamento: “Seremos capazes de combater a psicopatia no poder”? E considerou: “Precisamos ter cuidado, pois os valores da nossa sociedade hoje supe- restimam as pessoas poderosas e até mes- mo aquelas que têm uma certa indiferença – como se um grande executivo devesse ser uma pessoa fria para poder tomar as melhores decisões de negócio –, o que não é verdade. Os melhores acertos são de contribuição e nunca de eliminar o outro”. “A vitória política dos psicopatas é o fracasso de qualquer projeto macros- social altruísta, justo e capaz de gerar um bem-estar coletivo”, concluiu Ana Beatriz Barbosa Silva. • ” “ Ana Beatriz Barbosa Silva Médica psiquiatra, autora de diversos livros, entre eles o best seller “Mentes Perigosas: o psicopata mora ao lado” rupto pode ser comparado com o pedó- filo. O pedófilo é preso, e, se solto, volta a cometer o mesmo crime porque ele tem prazer nisso. De alguma maneira, o sistema beneficia hoje os corruptos, que são presos e depois soltos, e assim come- tem novamente os atos ilícitos”. “A grande diferença de um psico- pata para as outras pessoas que cometem erros é que o psicopata não se arrepende. São os pedófilos contumazes, são os cor- ruptos contumazes. Eles realmente não se arrependem. Não há nenhum sentimento de responsabilidade. Eles gostam de ser as- sim”, concluiu Ana Beatriz Barbosa Silva. Para a psiquiatra, o ambiente políti- co estimula características que o psicopata busca, como o poder, a manipulação e o status. “Quando o psicopata chega ao po- der, ele se cerca de uma série de outras pessoas que, se não são também psicopa- tas, têm uma certa simpatia pela maneira de ser do psicopata”, disse ela, ao se refe- rir ao termo “ponerologia” – estudo dos psicopatas ocupando o poder. O perfil do psicopata corrupto “A política é um dos meios mais propícios para ação dos psicopatas, já que poucas atividades oferecem tanto poder, status e oportunidade de manipulação; e isso não é uma exclusividade do tempo atual nem do nosso país. A psicopatia e a corrupção estiveram presentes em tem- pos passados, estão em todas as socieda- des, sexos, religiões. Os psicopatas são como insetos em volta da lâmpada em busca do poder, do status e da diversão”, considerou a psiquiatra Ana Beatriz Bar- bosa Silva. Nem todo corrupto é psicopata, mas todo corrupto contumaz é um psi- copata, na concepção de Ana Beatriz. “E são esses os que mais preocupam a so- ciedade, porque eles não param, sempre que tiverem uma oportunidade farão no- vamente”, declarou. Ela citou a prisão do atual governador Luiz Fernando Pezão e disse: “Nos deparamos com a prisão do governador e vimos que o ex-governa- dor saiu e o atual continuou fazendo as mesmas coisas. Existe uma compulsão por poder”. Ana Beatriz mencionou o psiquiatra polonês Andrew Lobaczewski,
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz