Revista Magistratus - Número 5 - Setembro 2018
30 Revista Magistratus 2018 C om a proximidade do pleito eleitoral, o noticiário tem sido povoado por um termo bastan- te incomum em eleições anteriores: fake news . Sob esse rótulo, são abrangidas não apenas as informações intencionalmente falsas, mas também aquelas incorretas propagadas por equívoco, bem como as imprecisas (por exemplo, a notícia de uma declaração muito antiga do candi- dato veiculada como se refletisse seu po- sicionamento atual ou fora de contexto). A preocupação com as informações dis- seminadas no período anterior ao plei- to precede a popularização da internet. Tanto assim que a propaganda eleitoral por rádio e televisão já contava com minuciosa regulação, inclusive no que diz respeito a debates entre candidatos (art. 46 da Lei nº 9.504/1997). A rede mundial de computadores, entretanto, potencializou o alcance de informações falsas e inexatas publicadas por pessoas comuns, tornando mais difícil e custosa a implementação das limitações legais. O exemplo mais emblemático da utilização da internet para a difusão de informações com o intuito de manipu- lação do eleitorado ocorreu nas eleições presidenciais dos Estados Unidos em 2016, 1 mas práticas semelhantes têm sido frequentes em outras eleições recentes ao redor do globo, como México, 2 Alema- nha, 3 Catalunha 4 e Reino Unido, 5 dentre outros. 6 Como a democracia baseia a for- mulação de políticas públicas no resulta- do das urnas, e sendo o voto influencia- do pelas percepções do eleitorado sobre a Por Bruno Bodart FAKE NEWS realidade, as fake news podem dar origem a políticas públicas enviesadas. 7 Para entender esse fenômeno, é necessário compreender os fatores bá- sicos que conduzem ao seu surgimento e à sua reprodução. Os incentivos priva- dos para a produção de fake news depen- dem dos custos e benefícios envolvidos na atividade. De um lado, o propagador de notícias poderá obter benefícios eco- nômicos e não econômicos (como a sa- tisfação de sua ideologia política) com a difusão de fake news . Por outro lado, a criação e gestão de informações social- mente indesejadas gerarão custos para o propagador, bem assim o risco de impo- sição de sanções cíveis e criminais. Em diversos contextos, os benefícios ten- dem a superar os custos da propagação de fake news . Isso porque a internet faci- lita a conexão entre pessoas dispostas a pagar por serviços do gênero e sujeitos dispostos a prestá-los. O investimento necessário para a reprodução de infor- mações na rede é baixo, 8 quanto mais com a utilização de robôs que atuam na divulgação de notícias a partir de algo- ritmos. Por fim, as diminutas chances de identificação dos responsáveis pela pro- pagação, aliadas às sanções brandas pela conduta, contribuem para a sensação de impunidade e fomentam a atuação dos propagadores de fake news . 9 A contaminação do debate polí- tico pela manipulação causada por fake news demanda a atuação dos poderes pú- blicos para, de forma cirúrgica, corrigir as imperfeições do “mercado livre de ideias”, prejudicando o mínimo possível a produção e o fluxo de informações na sociedade. Uma peculiaridade do mode- lo brasileiro consiste no fato de que o ór- gão responsável pela aplicação da lei no que diz respeito à propaganda eleitoral é o Judiciário. Sendo assim, o risco de que informações socialmente relevantes sejam impedidas de circular por razões A contaminação do debate político pela manipulação causada por fake news demanda a atuação dos poderes públicos para, de forma cirúrgica, corrigir as imperfeições do “mercado livre de ideias”, prejudicando o mínimo possível a produção e o fluxo de informações na sociedade “ “
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